São Paulo, quarta-feira, 12 de janeiro de 1994
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Guerra nas ruas

O país está em guerra contra os saques criminosos ao erário e boa parte dos brasileiros também se organiza nacionalmente para combater a fome. Mas é urgente que se abra uma nova frente da batalha pela civilização da vida brasileira: uma campanha contra a violência. A urgência não se deve ao fato de que se tenha chegado a um número insuportável de sequestros, assassinatos ou chacinas. Neste caso, não é possível esperar a gota d'água, ou de sangue. E talvez ela nem exista –o massacre de ontem parece ficar pequeno diante da carnificina de hoje, num círculo vicioso e bárbaro de aumento de insensibilidade e tolerância em relação a mortes cruéis e estúpidas.
A guerra de quadrilhas no Rio fez ontem mais três vítimas e uma criança morreu carbonizada em Recife depois que uma favela foi criminosamente incendiada. Em São Paulo, mais um preso morreu em mais uma revolta em mais uma cadeia superlotada. Tudo isso parece rotineiro –afinal, faz apenas quatro dias que a guerra do tráfico matou 12 pessoas, com a omissão da polícia, diga-se de passagem. Aliás, vive-se num país em que um senador da República, Saldanha Derzi (PP-MS) tem a desfaçatez de dizer que pode apelar a jagunços assassinos para "defender-se" de uma acusação.
Desde o massacre dos 111 do Carandiru a indignação da opinião pública tem subido de tom. Aumentou a pressão contra a violência da PM paulista. No Rio, o governo tem procurado afastar os policiais envolvidos em crimes. Tais medidas, no entanto, são pontuais e não evitaram os linchamentos, os motins em prisões e uma série de chacinas.
Há mais de meio século se contesta a solução atribuída ao presidente Washington Luís para a "questão social": polícia. Hoje nem a violência é apenas caso de polícia. Mas que quadrilhas fuzilem pessoas em praça pública é um sinal de que as forças de segurança foram reduzidas quase à inoperância. Uma campanha contra a violência tem de começar evitando pelo menos o absurdo de que cidadãos sejam passados a fogo em plena rua.

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