São Paulo, sábado, 15 de janeiro de 1994
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Ministro é prisioneiro do próprio sonho

JOSIAS DE SOUZA

Fernando Henrique fez a aposta de sua vida quando decidiu trocar o Itamaraty pelo Ministério da Fazenda, um cemitério de reputações. A mudança de endereço só foi possível porque o ministro desejava, desde então, a cadeira de presidente da República. Sabia que, para realizar sua ambição, precisaria rechear a biografia de intelectual bem-posto com uma grande façanha. Teria de espetar em seu currículo o esqueleto de um dragão.
A julgar pela desenvoltura da inflação, FHC hoje está mais distante do palanque do que quando entrou no Ministério da Fazenda. Após infindáveis negativas, o ministro admite, de forma clara, a própria candidatura. Num instante em que a superinflação bate em 40% ao mês, projetando inimagináveis 5.500% ao ano.
Há uma alternativa intermediária entre o sucesso improvável e a derrota quase certa. Fernando Henrique poderia deixar o ministério na pele de vítima. Confirmado o fracasso, argumentaria que teve as mãos atadas. Mas o Congresso e o Planalto cuidam para que toda a responsabilidade pelo eventual insucesso recaia sobre os seus ombros. Parlamentares não devem deixar de aprovar os planos da Fazenda. Itamar jamais curvou tanto o topete diante de um ministro da Fazenda.
Para escalar o palanque com alguma chance, FHC precisaria enterrar, ou pelo menos aplainar, a inflação até abril, uma missão quase impossível. Trama-se no Congresso a aprovação de emenda que empurre para junho o prazo de desincompatibilização. O suave Fernando Henrique teria então cinco meses para consertar a economia, algo que dois governos anteriores não fizeram em sete anos. O ministro é hoje prisioneiro do próprio sonho.

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