São Paulo, sábado, 15 de janeiro de 1994
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Médico italiano denuncia chantagem

HUMBERTO SACCOMANDI
DE LONDRES

O médico italiano Severino Antinori, precursor da gravidez pós-menopausa, revelou com exclusividade à Folha ter sido vítima de chantagem e denunciou uma "máfia científica". Ele afirmou ter pago cerca de US$ 50 mil a um biólogo britânico, seu ex-assistente, que o ameaçava de difamação. Disse que chegou a ser ameaçado de morte.
O médico italiano atualmente está no centro de uma controvérsia mundial sobre o tratamento de infertilidade em mulheres idosas. Nessa semana, uma de suas clínicas foi alvo de um distúrbio, causado segundo a polícia italiana por uma equipe de TV britânica que tentou entrevistá-lo. Os britânicos negam a versão de Antinori.
Após a exibição do programa numa TV do Reino Unido, Antinori entrou em contato com a Folha e deu a sua versão integral do caso, "que nunca contei a ninguém". É uma mistura de disputa científica, comercial e pessoal, com incursões sexuais, chantagem e ameaça de morte.
Segundo Antinori, seu principal assistente em 1986 era o biólogo britânico Simon Fishel. Naqueles anos, o médico italiano estava desenvolvendo a técnica que o tornaria famoso mundialmente.
A relação entre os dois piorou quando Fishel arranjou uma amante, no final dos anos 80. Ele teria deixado a mulher e trazido a amante para Roma.
"Várias vezes os dois foram pegos fazendo amor na minha clínica. Eu tolerei pois não quis me intrometer na vida privada dos meus funcionários", disse Antinori, para quem Fishel era um excelente técnico. "Era um miserável quando chegou. Em poucos anos ganhou mais de US$ 1 milhão". Após várias divergências com Fishel, Antinori o demitiu em 1990. Nessa época, Fishel teria conhecido o ginecologista britânico Robert Winston, a quem convidou para um encontro científico promovido por Antinori.
Logo a seguir, Antinori afirma que começou a ser chantageado. Fishel teria pedido cerca de US$ 50 mil para não iniciar uma campanha de difamação. Antinori diz ter atendido ao primeiro pedido e pago o dinheiro exigido. Após ser demitido por Antinori, Fishel foi contratado pela Universidade de Nottingham (região central do Reino Unido). Procurado pela Folha durante todo o dia de ontem, Fishel não foi encontrado.
A campanha contra Antinori teria então começado. O médico italiano afirma que, para isso, Fishel pediu ajuda a Robert Winston, do Hospital Hammersmith, considerado um dos mais respeitados ginecologistas do Reino Unido. Procurado pela Folha, Winston admitiu conhecer Fishel, mas se negou a comentar as acusações de Antinori, dizendo-se disposto apenas a responder questões científicas.
Winston tem movido uma intensa campanha contra a gravidez pós-menopausa. "É um tratamento que qualquer ginecologista poderia fazer, mas que todos se recusam por questões éticas", disse. Segundo ele, a terapia tem três pontos negativos: 1. pode afetar a saúde das mulheres; 2. é preciso respeitar a perspectiva das crianças; 3. desacredita a medicina de reprodução.
Antinori argumenta que já tratou 150 pessoas e nunca houve um único problema, que a técnica é segura. "É claro que há questões éticas. É uma técnica nova, assusta as pessoas", afirmou. É preciso, segundo ele, que a sociedade decida se deseja isso ou não.
"Winston é dessa máfia científica", acusou Antinori. Ele disse ainda que Winston é líder da maçonaria britânica e tem grande controle sobre universidades, pesquisa e revistas científicas no Reino Unido. "Os principais especialistas britânicos, como Robert Edwards, criador do bebê de proveta, me apóiam", afirmou.
"Fui ainda ameaçado de morte por uma pessoa que se dizia amiga de Fishel", afirmou Antinori. Mas ele não quis dar mais detalhes sobre esse caso.

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