São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 1994
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Dilema eleitoral: emoção não, razão sim

ANTONIO ERMÍRIO MORAES

Antonio Ermírio de Moraes
Ele é um jovem impetuoso. Mas, dissimula bem. Durante a campanha, radicalizou ao extremo. Chegou a revelar a sua disposição de bombardear a Alemanha, Estados Unidos e Japão com artefatos nucleares. Depois de eleito, conteve-se. Abandonou o discurso radical, vestiu a camisa da moderação e promete colaborar com Boris Ieltsin –a quem tanto atacou nos palanques.
Essa é a dupla personalidade de Vladimir Jirinovski, o novo parlamentar da Rússia, que conquistou a sua cadeira pregando teses do nazismo e motivando milhões de eleitores descontentes com as reformas econômicas que submetem o povo ao mais profundo sacrifício. A situação do país é catastrófica. A comida é escassa e a fome começa a grassar. Os empregos desapareceram e os serviços públicos entraram em colapso. Saúde e educação se deterioram a cada dia. O aquecimento não dá conta do rigoroso inverno de 1994. Nesse quadro, é normal que os discursos radicais venham a prosperar.
O Brasil também num ano eleitoral. A situação econômico-social, embora não tão desastrosa, é preocupante. Inflação, desemprego, violência, serviços de saúde e educação desmantelados formam um caldo de cultura propício aos discursos radicais –de esquerda ou de direita– a mesma esquerda que sofreu duro golpe com o colapso do comunismo e a direita que parecia ter morrido com a queda do nazismo e do fascismo na Europa.
A história mostrou que tanto as idéias da direita como os métodos da esquerda estão inteiramente superados para resolver os problemas de crescimento e liberdade. Mas, os dias atuais revelam também que os discursos radicais calcados continuam sendo bastante funcionais para ganhar eleições em situações de forte descontentamento.
Não se pode dizer que o sucesso desses discursos seja fruto da ignorância. Afinal, os surtos de nazismo e fascismo que hoje ocorrem na Europa e Estados Unidos contam com o apoio de eleitores ditos educados. Tudo indica que, a linguagem radical mexe melhor com as emoções. Trata-se de uma forma simplória de apresentar soluções que, na prática, são meras promessas de vento pois nada do que é proposto pode ser implementado. Tanto que os radicais, ao se tornarem governantes, moderam suas ações.
Para o político, porém, ganhar a eleição é a primeira fase. Governar vem depois. Essas fases que, não deveriam ser articuladas, na prática, são muito mais independentes do que se pensa. As eleições em países em crise se resolvem muito mais pela emoção do que pela razão. A única coisa que parece superar a força da manipulação emocional são resultados concretos que permitam à maioria sentir-se satisfeita ou esperançosa.
O Brasil está nessa encruzilhada. Sem uma substancial melhoria no quadro social, o terreno estará todo aberto para os vendedores de ilusões –de todas as posições. Assim foi na eleição de 1989 quando o embate se deu entre dois pólos do mais vulgar populismo. Assim poderá ser em 1994, se os eleitores continuarem sem saber o que será de suas vidas. Nesse caso, estaremos entre Fidel e Jerinovski. Que tal pensarmos no Brasil antes de nos decidirmos eleitoralmente?
Antonio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.

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