São Paulo, sexta-feira, 28 de janeiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Competências equivocadas

ANTONIO ROQUE CITADINI

A afirmação é do presidente da Corte de Contas da Itália: "a melhor maneira de um Poder ou órgão se desmoralizar é receber competências ou poderes demais".
Ora, é fato notório que as Cortes de Contas, nos países em que sabidamente funcionam em nível de excelência, têm fundamentalmente duas dunções: a de auditoria e a de julgamento das contas públicas. Sem outras competências extravagantes ou exóticas.
O grande esforço dos órgãos de controle das receitas e despesas públicas, nos Estados Unidos e na Inglaterra, é no sentido de avançar em busca de constante melhoria das técnicas de auditoria.
Porque quanto melhor auditados os órgãos sob fiscalização, melhor o subsequente julgamento das respectivas contas.
Aperfeiçoar a auditoria implica em treinamento de pessoal, em racionalizar a estrutura administrativa dos órgãos de fiscalização de contas públicas e na informatização desses serviços.
Nos últimos seis meses, três novas leis federais não especificadas de finanças públicas aumentaram –até de maneira inesperada– significativamente as competências dos Tribunais de Contas.
Ainda que se deva entender e respeitar a boa intenção do legislador –premido pelas pressões da imprensa e da opinião pública, no sentido de coibirem-se práticas governamentais e administrativas eivadas de corrupção–, essas leis vieram a aumentar os trabalhos das Cortes de Contas –de resto já sobrecarregadas com os encargos atuais e funcionando com estruturas sempre defasadas– e nenhuma delas dentro do espírito de melhorar as auditorias para melhorar os julgamentos.
Vejamos:
A nova lei de licitações: criou a apreciação preliminar, pelas Cortes de Contas, dos editais, o que é um procedimento quase a priori dos atos da administração, modalidade de fiscalização pouco usada hoje no mundo, por implicar em risco de retardamento ou paralisação da atividade administrativa, acarretando, em regime inflacionário, como no Brasil, em reajustes de preços, ou novos preços, se levar a nova licitação. Além de reduzir a decisão dos Tribunais de Contas, nesta etapa, a mero julgamento de legalidade.
Nova lei Eleitoral: estabelece que a Justiça Eleitoral vai requisitar auditorias dos Tribunais de Contas para fiscalizar as contas dos partidos políticos nas eleições.
Por último, a lei 8.730, de 10 de novembro, sobre a obrigatoriedade da declaração de bens e rendas dos ocupantes de cargos e funções no Executivo, Legislativo e Judiciário federais, a ser apresentada ao respectivo órgão, com cópia para o Tribunal de Contas da União, o qual pode baixar instruções sobre a matéria e exigir, a qualquer tempo, a comprovação da legitimidade da procedência do acréscimo patrimonial.
A não-apresentação da declaração ao TCU, ou inexatidão, implicam em crime de responsabilidade até do presidente da República e em infração político-administrativa, crime funcional ou falta grave disciplinar, possível de perda do mandato, demissão, além de inabilitação até cinco anos para cargo ou mandato.
Como é fácil concluir, todas estas leis, que atribuem graves responsabilidades aos Tribunais de Contas, fogem das competências originárias e tradicionais destes órgãos, certamente vão gerar áreas de atrito desnecessárias, e em desacordo com o sentido de modernização que as Cortes de Contas estão tendo no mundo.

Texto Anterior: O enunciado n.º 330 do TST
Próximo Texto: INPC-E sobe para 39,74%; IPCA-E vai a 39,17% este mês
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.