São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 1994
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'Uma moça foi comprar cigarro e se salvou'

DA REPORTAGEM LOCAL

Darci Paiolla, secretária administrativa da diretoria do Crefisul, foi uma das cerca de 200 pessoas que se refugiaram no topo do edifício Joelma. Faz parte da metade daqueles que tentaram escapar do fogo subindo para o alto do prédio. "Corri lá para cima sem saber o que ia encontrar. Não tínhamos treinamento para enfrentar uma situação como aquela. Estava no 19º e tentei descer a escada, mas subiam rolos de fumaça preta. Todo o prédio era acarpetado, cheio de móveis e divisórias de madeira".
Darci conta que passou a maior parte do incêndio na beirada do Joelma, vendo pessoas se atirarem e pensando se tirava ou não a roupa: "Não tinha fogo onde eu estava, mas o calor era horrível. Me diziam para eu ficar com a roupa e a sandália, pois de outro modo a minha pele é que ia queimar. Eu ardia e estava inchada de tanto calor. Pensei que ia acontecer comigo o mesmo que tinha visto no incêndio do Andraus, aquela gente despencando. Na época, trabalhava no edifício Itália e assisti aquele horror de lá", conta.
A secretária, na época solteira e com 28 anos, diz que depois do incêndio é que soube das histórias de "sorte e de horror" que ocorreram no dia. Darci viu pessoas "sentadas indiferentes nas janelas, esperando a morte" e também assistiu uma office girl tentar fugir do fogo imaginando que poderia usar o guarda-chuvas como paraquedas. "Dona Francisca, que servia o café e estava grávida de nove meses não subiu com a gente. Morreu queimada numa janela do 17º. Uma menina, a Rosa, secretária da diretoria, desceu para comprar cigarro. Quando voltou, não pôde mais subir", lembra.
Darci conta também a história de um diretor do banco que, avisado pela sua secretária do incêndio, não acreditou. "Ele ficou na sala dele, trabalhando, no 12º andar. Foi um dos que se atirou".
"Durante um ano, ou pouco mais, fiquei com fobia de elevador e de prédios. Toda a vez que faltava luz, como aconteceu no Joelma, ficava em pânico", conta Darci, que casou e tem dois filhos. "Me recuperei rápido. Nunca sonhei com aquilo".

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