São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 1994
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'Pulei para não morrer queimado e sobrevivi'

VINICIUS TORRES FREIRE
DA REPORTAGEM LOCAL

Hiroshi Shimuta e Mario Ligere não estavam onde deviam no dia 1º de fevereiro de 1974. Os dois eram funcionários do Citibank, que havia comprado parte do Crefisul, sediado no Joelma. Shimuta, 30, trabalhava meio período em cada lugar -as manhãs no Citi. Desde o final de janeiro, decidira alternar as semanas e não os horários. Mesmo sua mulher, que tivera gêmeos no dia 18, achava que ele estava no Citi e não no meio do fogo. Ligere, 23, por sua vez, teve que sair de sua sala para participar de uma reunião com seu colega Shimuta, na outra ala do prédio. Todos os seus subordinados, que ficaram no setor de Ligere, morreram.
Os dois estavam no 22º andar quando o incêndio começou. Ficaram por ali mesmo, com mais cinco colegas. Se refugiaram em um banheiro na ponta do andar. "Tentamos descer, mas as escadas eram chaminés de uma fumaça negra, amarga. Pelas janelas víamos labaredas e vidros estourando. De tempos em tempos explodiam os bujões de gás do serviço de café", lembra Shimuta. Quando a fumaça e o calor ficaram insuportáveis, Ligere decidiu pular pela janela: "Não queria morrer queimado. Queria que reconhecessem meu corpo". Ligere caiu na sacada, onde os outros seis colegas acabaram se refugiando, se agarrando uns nos cintos dos outros, como alpinistas.
Shimuta diz que dava uns chutes nos amigos mais nervosos e pedia calma. "Alguém tinha que controlar aquele pânico. Víamos muitas pessoas se atirando, o calor das labaredas alcançava a gente. Achava que tinha ficado cego por causa da fumaça, mas pensava: 'pelo menos vou sobreviver'. Foram salvos pelos bombeiros, por escadas.
O economista Shimuta, hoje empresário, disse que se tornou uma pessoa mais feliz depois do incêndio. "Vivia para poupar. Depois do acidente decidi tirar o máximo de prazer que os meus cinco sentidos podiam me dar e me tornei mais espiritual, generoso". Ligere, que dez dias depois do Joelma escapou de morrer quando um caminhão caiu sobre seu carro, pegou o hábito de conferir todas as saídas de segurança de qualquer lugar que entre.

Colaborou Juca Varella, repórter fotográfico

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