São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 1994
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Fevereiro de cara amarrada

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Congresso quebrou a perna do ministro Fernando Henrique Cardoso (Fazenda) –não só dele. Agora, de muletas, lá vem a URV (Unidade Real de Valor) e a fase dois do Plano FHC.
Isto mesmo, não há volta possível. O ministro está amarrado ao seu plano. Agora, o governo vai tirar da cartola algum tipo de taxação para empresas e bancos. O sentido não será tanto o de arrecadar, mas o de justificar politicamente a manutenção do aumento do Imposto de Renda da pessoa física e, é claro, que o Orçamento está equilibrado.
Fevereiro tinha uma cara antes de quinta-feira. Um mês de inflação mais baixa e mais calma. Mas vieram a vergonhosa, desconcertante e ilustrativa atuação do Congresso e a demissão do diretor de Política Monetária do Banco Central. E rumores. Francisco Pinto caiu, comentaram uns, pelo desgaste dos juros altos ou, como disseram outros, por divergências que surgiram quando a equipe econômica começou a pensar melhor no que iria fazer na segunda fase do plano e a rascunhar "n" medidas provisórias.
Seja qual for a verdade, o certo é que a cara de fevereiro mudou aos olhos do mercado financeiro. A inflação de baixa passou a ser vista como piso –menor, daqui para frente, não vai ficar.
Fevereiro passou a ser tido como um mês de pressões sobre o ministro, que já não anda bem da coluna. Pressões políticas –do Congresso e do partido, o PSDB, já que a derrota empurrou o governo para a revisão constitucional em busca de novas medidas na área fiscal– e pressões dos preços. Apesar do desmentido, somente a dúvida no ar sobre a forma de conversão das tarifas públicas já será suficiente para justificar novas remarcações "preventivas".
Na sexta-feira, algumas listas, dizem analistas do mercado financeiro, já vieram mais pesadas. Os preços, altos, podem afugentar o consumidor. Não importa. O medo é não sobreviver, com o preço convertido pela média e parte dos custos, que corresponde às tarifas públicas, no pico. Do outro lado da linha, as centrais sindicais já avisaram: conversão dos salários pela média é inaceitável.
Pior é que um analista, desolado, deixou escapar o seguinte comentário: um assessor corre as mil milhas, outro esquia, outro pede demissão e outro dá duas entrevistas (uma para desdizer a outra). Definitivamente, as coisas não estão nada bem.
Mas, sem outro jeito, sorrindo para as câmeras, com dor nas costas e com o sapato 42 já ficando apertado, vamos lá, ladeira acima. Lá vem a URV.

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