São Paulo, quinta-feira, 13 de outubro de 1994
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Credibilidade e credulidade

Talvez a maior lição dos últimos anos e, principalmente, dos últimos meses, é que política econômica é sinônimo de credibilidade. Qualquer política econômica.
A redução de tarifas públicas, exatamente num momento em que se verifica forte aceleração de alguns preços, coloca em primeiro plano a questão da credulidade. Não há outro ponto de referência senão o passado e sabe-se bem no que resultou, no passado, a contenção artificial de tarifas. Em alguns casos, o artifício não apenas foi inútil como compensação à alta da inflação, mas também levou a uma deterioração ainda maior das finanças das empresas estatais, ajudando a criar déficit público e, portanto, inflação –o oposto do que se desejava inicialmente.
Evidentemente, reduzir tarifas não é ruim por definição. Se, como no caso do petróleo, em larga medida importado, fica claro que a valorização do real e a queda das cotações internacionais justificam a redução do preço (ainda que simbólica). Há uma racionalidade.
Na telefonia e no correio já é outra a história. Não há nenhuma relação unívoca ou simples entre câmbio e preços. O cálculo de tarifas telefônicas leva muito mais em conta, por exemplo, certas necessidades de investimento e expansão do próprio serviço. Se a redução das tarifas vier a comprometer investimentos, na prática isso pode significar ganhar um prêmio agora (preços menores) em troca de sofrimento futuro –quando a escassez de linhas provoca até mesmo inflação.
A decisão quanto a tarifas postais e de telefonia é menos transparente que a relativa a combustíveis. E ocorre exatamente quando se espera que a inflação mensal saia da casa de 1% para bater em pelo menos 2,5%. É de se esperar então que o governo venha esclarecer qual é a lógica por trás da redução, se houve ganho de produtividade, diminuição de custos ou outra razão que assegure que a tarifa menor é também realista. De outra forma, o risco é que a credibilidade da política econômica seja afetada.
Mas como afinal definir ``credibilidade", conquistá-la e mantê-la? Há um caminho: fazer hoje coisas pelas quais se possa responder amanhã. Credibilidade é sinônimo de responsabilidade. Sem responsabilidade, ela degenera em credulidade, ou seja, aposta irracional em que algo tem que dar certo. O caminho mais curto para o fracasso.

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