São Paulo, sexta-feira, 14 de outubro de 1994
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Milagre baiano

JANIO DE FREITAS

Os mapas de apuração na Bahia revelaram um fenômeno eleitoral: em mais de 1.400 urnas, o candidato a senador Waldeck Ornelas tem muito mais votos do que seu puxador de votos, Antônio Carlos Magalhães, que o lançou apenas para completar a dupla de postulantes ao Senado encabeçada por ele próprio. Esta inversão da lógica eleitoral foi que proporcionou a Ornelas a segunda vaga baiana no Senado e a Waldir Pires, derrotado por 3.000 votos, uma evidência a mais para pedir à Justiça Eleitoral a recontagem das urnas.
Pelo menos um episódio de transferência de votos de Antônio Carlos para Ornelas resultou em flagrante e divulgação. Um juiz de Feira de Santana, advertido por fiscais, confirmou a troca e determinou a reversão dos votos. Mas os indícios de troca sem flagrante são muitos. Ornelas, político do interior, com mais votos do que Antônio Carlos até em urnas de Salvador, é mais do que suspeito.
À parte a supremacia exótica do puxado pelo puxador em número tão alto de urnas, a insignificância da diferença entre Ornelas e Waldir Pires justifica, por si só, a recontagem para que não permaneçam dúvidas comprometedoras: em 2.579.358 votos, a diferença foi só de 3.000. Ou 0,1% decidindo uma cadeira do Senado. Se a isso juntarmos o desempenho ilógico e anormal de Ornelas, só mesmo com recontagem, pelo menos das urnas em que ultrapassou Antônio Carlos, será possível admitir que ele chegue ao Senado com legitimidade.
Já aconteceu em Mato Grosso nesta semana, e também em relação a uma vaga para o Senado, a inversão do vitorioso por recontagem parcial. O peemedebista Carlos Bezerra teve afinal reconhecidos como seus pelo TRE-MT os votos que foram parar no seu adversário Manoel Novaes e a este haviam dado a vitória.
A rigor, a recontagem devia ser geral, em todos os Estados. A fraude eleitoral é uma instituição brasileira mais velha do que a eleição. Antes da primeira votação, já a fraude fora preparada.

Gastos inúteis
Ministros brasileiros viajam mais do que caixeiros-viajantes. Para nada de proveitoso. Agora mesmo o ministro Ciro Gomes está iniciando por Mossoró, Rio Grande do Norte, o que ele chama de cruzada de pregação por pequenas cidades para propagar o Plano Real. Com uso da TV em vez de avião a jato e tanta gente mobilizada, alcançaria todas as cidades pequenas sem gastar um centavo dos cofres públicos.
Só o custo de uma viagem assim sustentaria um núcleo de famílias miseráveis por longo tempo. Ou aplacaria as aflições de um dos tantos hospitais públicos em estado deplorável. Mas as economias são feitas justamente nos gastos com a pobreza e a saúde.

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