São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 1994
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Fuga de aplicações leva governo a frear consumo

GUSTAVO PATU ; VIVALDO DE SOUSA; FIDEO MIYA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FIDEO MIYA
Pela primeira vez desde o lançamento do real, a equipe do ministro da Fazenda, Ciro Gomes, recebeu dados apontando uma fuga generalizada de dinheiro das aplicações financeiras em direção ao consumo.
São números expressivos: neste mês, em apenas 10 dias (até o último dia 10), houve retiradas líquidas (descontados os depósitos) de R$ 731,5 milhões (cerca de US$ 872 milhões) do conjunto das aplicações financeiras, mesmo com os juros altos pagos atualmente.
Até o mês passado, as aplicações vinham registrando captação positiva de recursos (depósitos superiores aos saques), de R$ 2,622 bilhões em setembro e de R$ 619,4 milhões em agosto.
A saída dos recursos é mais forte nas aplicações populares –poupança (R$ 276,7 milhões), Fundo de Curto Prazo em URV (R$ 179,2 milhões) e fundão (R$ 125,2 milhões).
As retiradas não se restringem a elas, porém. Investimentos em CDBs (Certificados de Depósitos Bancários) e fundos de commodities, preferidas por consumidores mais sofisticados e de maior poder aquisitivo, também registraram perdas. Nos CDBs, elas foram de R$ 201,3 milhões e, nos fundos de commodities, R$ 109,5 milhões.
As exceções foram os fundos de ações, de carteira livre e renda fixa, que somados receberam R$ 219,2 milhões. Estes fundos, entretanto, incluem dinheiro de pessoas jurídicas e de investidores estrangeiros, que têm ampliado suas aplicações gradualmente.
Já os CDBs, fundões, cadernetas de poupança, DERs (Depósitos Especiais Remunerados) e fundos de curto prazo e commodities perderam juntos R$ 950,7 milhões.
O fenômeno pode explicar a ameaça feita pelo ministro Ciro Gomes anteontem, no sentido de elevar ainda mais os juros para conter o consumo e a decisão preliminar da equipe econômica de partir para medidas que esfriem a temperatura do comércio.
Desde a semana passada, quando foi constatada a fuga de recursos das aplicações financeiras, o ministro tem insistido para que a população refreie seu impulso de compras.
A preocupação também dominou a reunião da equipe econômica de anteontem. Foi apresentada uma pesquisa, feita entre famílias com renda até 20 salários mínimos, na qual se constata o crescimento do consumo após a implantação do Plano Real.
O dinheiro sacado das aplicações inflou a quantidade de dinheiro em poder das pessoas e nas contas-correntes. Na avaliação de técnicos do Banco Central, o movimento caracteriza uma ``bolha" de consumo que começou a inchar no final da primeira semana de outubro.
Segundo detectou a assessoria do presidente do Banco Central, Pedro Malan, alguns dos maiores bancos do país, como Bradesco, Itaú e Banco do Brasil, vêm registrando captação negativa de recursos.
O dado é considerado sintomático pela equipe, porque tais bancos concentram os investidores de pequeno e médio porte.
Tais investidores não têm o hábito de trocar de aplicações. Em geral, quando sacam dinheiro, o objetivo é o consumo.

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