São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 1994
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Filme reflete paixão e horror à criminalidade, diz Oliver Stone

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

A mídia ocidental –especificamente a mídia americana– é o tema de ``Assassinos por Natureza", o último filme de Oliver Stone. ``Este filme me exauriu por completo", ele confessa. ```Preciso de um tempo para refazer minha cabeça antes de atacar qualquer outro projeto."
O público provavelmente terá a mesma impressão: livremente baseado num roteiro original de Quentim Tarantino (``Cães de Aluguel"), ``Assassinos por Natureza" segue a trajetória sanguinolenta de Mickey e Mallory Knox (Woody Harrelson e Juliette Lewis), dois sociopatas do sudoeste americano, onde seus crimes são seguidos com igual avidez pela polícia e pela mídia.
``Assassinos por Natureza", contudo, é muito mais que esta história: é uma alucinante montanha russa visual e auditiva, na qual Stone tritura e reconstrói imagens e sons de todos os quadrantes da história contemporânea.
Elogiadíssimo pela crítica americana e européia, ``NBK" está há sete semanas em cartaz nos Estados Unidos, onde já fez mais de 45 milhões de dólares na bilheteria –não um estouro de bilheteria, mas é uma soma respeitável para um filme que vai contra todos os cânones do cinema comercial.
Folha - Este filme foi escrito originalmente por Quentin Tarantino. Por que ele recebeu apenas crédito como autor da história na qual ``Assassinos por Natureza" se baseia?
Oliver Stone - Tarantino escreveu este roteiro três anos atrás, aproximadamente. Era um roteiro brilhante. Por várias circunstâncias diferentes, ele acabou indo fazer ``Cães de Aluguel". Ele vendeu o roteiro de ``Assassinos..." para alguns produtores que passaram anos tentando levantar financiamento e sendo rejeitados por toda a indústria.
Quando finalmente o roteiro chegou às minhas mãos, eu adorei. Instantaneamente. Mas percebi que ali havia uma idéia em estado bruto –era o texto escrito por um homem de vinte e poucos anos. Sou um quarentão, faço filmes com uma textura diferente. Mas os personagens e a estrutura do roteiro de Tarantino eram maravilhosos. Senti que precisava pegar essa estrutura e acrescentar minha visão do material. Tarantino foi muito bem pago para ter esse crédito de autor da história.
Folha - Que tipo de filme você queria fazer com esse material?
Stone - Eu disse certa vez e ainda acredito que faço filmes como uma forma de terapia. Eu queria que esse filme refletisse toda a minha carreira como cineasta –os nove filmes que fiz até agora, nestes últimos oito anos.
Que somasse uma série de temas centrais à experiência americana neste fim de século: a violência, a mídia, a hipocrisia da mídia com relação à violência, nosso amor por armas, nosso horror às armas, nossa paixão pelo crime, nosso horror ao crime. Em suma, que resumisse nossa ambivalência em relação à violência.
Folha - O que reação você espera com ``Assassinos por Natureza"? Que mudanças você acha que o filme pode causar?
Stone - Este filme é uma sátira, e uma sátira sempre distorce –e, ao distorcer, faz pensar, eu creio. Além de fazer pensar, não creio que eu possa ambicionar mais nada, ou aceitar responsabilidade por mais nada. Não posso acreditar que este filme, sozinho, vá lançar uma bomba de neutrons sobre todo o problema da violência e do crime e liquidar com tudo.
Folha - É preciso mostrar violência explicitamente para fazer o público refletir sobre ela?
Stone - Para incomodar, sim. E, se este filme funciona como sátira, com todo poder metafórico da sátira, ele tem que exagerar. Veja o que está nas telas: filmes como ``True Lies" e ``Velocidade Máxima", que são movidos exatamente pela energia, pela adrenalina da violência.
São duas horas de violência às quais o espectador é submetido, mas sem consequência alguma –nada foi refletido, nada foi meditado, nada foi analisado. Diversão pura. Violência de fantasia. Este filme pelo menos, perturba as pessoas. É difícil sair dele intacto. E é essa, exatamente, a idéia.

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