São Paulo, domingo, 23 de outubro de 1994
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Denúncias de placebo

LUÍS NASSIF

O médico Alceni Guerra, ministro da Saúde do governo Collor, foi crucificado por acusações vagas, de autoria difusa e jamais comprovadas, mas que sabia-se que partiam de quadrilhas incrustadas na Fundação Nacional de Saúde.
Com sua queda abortaram-se programas de saúde que receberam prêmios internacionais, por salvar vidas internamente.
Depois, foi absolvido, mas pouco se noticiou.
Mais uma vez governo e imprensa estão embarcando na mesma armadilha, com o episódio envolvendo o segundo escalão do Ministério da Saúde.
Na sexta-feira, o "Diário Oficial" publicou portaria do ministro da Saúde, Henrique Santillo, ordenando o afastamento temporário do secretário-executivo, Deoclécio Campos Júnior, e do secretário de Vigilância Sanitária, José Geraldo Martinelli.
São pessoas de passado limpo, professores da Universidade Nacional de Brasília (UnB), respeitados nacionalmente, e que vinham desenvolvendo trabalho excepcional para moralizar a Vigilância Sanitária.
Nos últimos meses, tiraram do mercado cerca de 200 medicamentos, num feito que obteve reconhecimento de algumas revistas médicas internacionais e provocou o descontentamento de setores poderosos.
Ao mesmo tempo, promoveram profunda reestruturação na Vigilância Sanitária, visando descentralizar os serviços. Seria a maneira de eliminar definitivamente o cartel da corrupção que por lá se instalou.

Motivos fúteis
Os motivos do afastamento são fúteis. Na reestruturação da Vigilância Sanitária foram demitidos 21 funcionárias.
Uma das funcionárias demitidas, e obviamente ressentida, fez acusações de não tomarem providências em relação a suas denúncias de desmandos na área.
Não bastou a evidência de que Deoclécio havia solicitado inquérito à Polícia Federal, nem de que Martinelli havia aberto inquérito administrativo assim que assumiu o cargo, meses atrás.
Seu afastamento temporário foi solicitado ao ministro da Saúde, Henrique Santillo, a fim de que }não atrapalhassem as investigações.
Não se sabe por que razões, há tempos certas áreas do Palácio do Planalto têm investido contra técnicos sérios do Ministério da Saúde.
Já as investidas contra Henrique Santillo têm motivo conhecido: a utilização política de recursos na campanha eleitoral de Goiás, comprometendo sua até então inatacável imagem de administrador.
Enfraquecido, Henrique Santillo entrega de bandeja a cabeça de assessores corretos, não se comportando com a lealdade de um chefe.
Daqui a alguns dias, quando a comissão encerrar suas investigações, certamente a dupla será absolvida.
Mas quem os ressarcirá das manchetes de jornais e televisões, associando-os à corrupção da Saúde?

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