São Paulo, domingo, 23 de outubro de 1994
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Revigora buscar tesouros no passado

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há quem não goste destes meus mergulhos ao passado. Mas acho revigorante buscar este ou aquele tesouro perdido na memória e emergir com um objeto qualquer que se ajuste perfeitamente, e até enriqueça, o cenário de todo dia.
Por exemplo: hoje jogam Corinthians e Lusa. E ainda estou vendo a cena recente, tendo Ronaldo como personagem central, na última apresentação de seu time. Um tiro de longa distância, o vôo rasante do goleiro, a bola no pé da trave direita, o ricochete e o avante disparando no outro canto, onde Ronaldo já se encontrava.
Vi, neste quase meio século, mil defesas impossíveis. Aquela sequência de Rodolfo Rodriguez, no Santos, contra o América de Rio Preto, creio, foi inesquecível. Testemunhei o grande Gilmar operar milagres, assim como Castilho, Veludo, Poy, Manga, Carrizzo e Leão.
Mas como essa do Ronaldo, só me lembro de outra, feita por Muca, um goleiro paranaense, de estatura mediana como Ronaldo, e que durante alguns anos defendeu a meta lusa, no começo dos anos 50. Não me recordo o adversário, nem mesmo sei se Muca defendia a Lusa ou a seleção paulista. Vejo-o apenas em pleno vôo para rebater a bola que ia direto para o canto esquerdo. Rebateu bem ali no cantinho. Na recarga, o centroavante, que entrava na corrida, chutou, forte, rasteiro e certeiro, no canto oposto. Pois Muca parece ter tão somente resvalado no chão para alçar novo vôo de volta e aterrissar com a bola colada ao peito. Acredite quem quiser. Mas, juro, foi verdade.
Assim como é verdade que estou me desviando, em pleno vôo, do assunto principal: o jogo de hoje entre Corinthians e Portuguesa. Mas é só para tentar acender no torcedor luso uma saudade, prima-irmã da esperança, como no verso parnasiano, driblando assim a dura realidade dos dias atuais.

Muita gente ainda está perplexa com a atuação dos jovens do velho Zagalo. Nem me surpreendo, tampouco me entusiasmo. Não me surpreendo porque Zagalo, apesar da fama de retranqueiro, já deu mostras de que é capaz de contrariar na prática suas teorias. Basta lembrar a Copa de 74, na Alemanha, quando não tivemos nem mesmo um cabeça-de-área típico. Com a dispensa de Clodoaldo, machucado, jogou por ali Carpeggiani, um meia estilista, armador nato, com insopitável ânsia de artilheiro. Isso, ao lado de Rivelino, Leivinha, Paulo César Caju e outros tantos incapazes de darem nem um carrinho sequer. E não cultivo esperanças vãs porque seu mais caro discípulo –Parreira– também colocava em campo um time extremamente ofensivo, para dar marcha-à-ré, na hora H, na Copa.

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