São Paulo, domingo, 23 de outubro de 1994
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`Dimensão Utópica' traz `evolução' de Antunes

SEBASTIÃO MILARÉ
ESPECIAL PARA A FOLHA

Fazendo-se de vítima, Nelson de Sá tentou responder minha réplica à sua resenha sobre meu livro ``Antunes Filho e a Dimensão Utópica" (Perspectiva), no suplemento Mais! (2/10/94). Quer, por toda lei, sustentar o insustentável.
Sua crítica não é opinativa, só caluniosa: faz afirmações absurdas atribuindo-as ao meu trabalho. Reptou-me em cinco pontos que, por certo, considera irrespondíveis. A começar pela tolice a que chama ``tese central do livro", de que me dediquei a provar que a montagem de ``Vereda da Salvação (1964) é mais importante do que ``Macunaíma". Chama o próprio livro por testemunha, citando: ``as pesquisas, os laboratórios, as prospecções cênicas, as relações internas do grupo, tudo derivava das experiências anteriores". Omite a frase antecedente que diz: ``Resgatou os processos desenvolvidos em `Vereda da Salvação', `A Falecida' e `Peer Gynt' ".
O meu estudo é sobre o processo evolutivo do encenador e o trecho citado diz apenas que, em ``Macunaíma", Antunes retomou processos que haviam sido abandonados depois da montagem de ``Peer Gynt" (1971). Este é o sentido do texto. Onde o confronto das montagens?
Preferiu não entender que ao dizer ``vergonha", Antunes não renegava toda a sua produção anterior, mas a dos anos 70, entre ``Peer Gynt" e ``Macunaíma". Quanto à minha conclusão de tratar-se de ``vergonha hiperbólica", vai justificada no ensaio.
No segundo ponto, afirma que, por ter lido a apresentação, colocou na resenha que a desproporção entre a atenção dada a uma e a outra peça ``poderia ser corrigida em edição futura". Referi-me, na apresentação, a outro livro e não a uma futura edição da ``Dimensão Utópica". E se sabia disso, por que se escandalizou tanto com a dita ``desproporção"? A muleta não se ajusta.
No terceiro ponto, tenta demonstrar que, como levianamente afirmou, fiz comparação entre Antunes e Judith Malina. Cita trecho onde falo que, com as montagens de ``Vereda" e ``A Falecida", Antunes ``apresentou vários `paralelos e pontos de contato' com o trabalho de (...) Beck e Malina". Omite, nos parênteses, os nomes de Grotovski e Peter Brook, de quem aliás é a frase ``paralelos e pontos de contato". O capítulo evoca movimentos do início dos anos 60 que, através de novos conceitos sobre o fazer teatral, rompiam com procedimentos anteriores e propunham o novo teatro.
Não falo de identidade estética, mas de atitudes sintonizadas com os novos tempos. Logo, não cometo o absurdo de traçar ``comparação" entre Antunes e Malina.
Não evito lembrar frases de minha autoria, como afirma no quarto ponto. Apenas não me concedem espaço suficiente para recolocá-las no contexto do qual o ``crítico" as tirou para seus fins caluniosos. Mas se não lhe agrada a frase lembrada –``vê-lo dirigir é algo maravilhoso"–, tanto faz: ver Antunes dirigir seus atores continua sendo algo maravilhoso. Agora, quanto as relações do ``crítico" com Zé Celso... problema dele. E Zé Celso surgiu na réplica porque apareceu na resenha.
O quinto ponto traz sua ridícula afirmação de que ``editei" ``a crítica de Décio de Almeida Prado, sobre `Vereda da Salvação', evitando ``trechos negativos". É uma pilhéria. Primeiro, porque não ``edito" críticas, ``cito". E a citação corresponde à necessidade do discurso. Segundo, porque as objeções de Décio de Almeida Prado já haviam sido colocadas no texto. Terceiro, cito a fonte possibilitando a consulta a quem se interessar. Além disso, usei não só a crítica do professor Décio, mas também o depoimento que ele teve a gentileza de prestar-me para esse trabalho.
Se Nelson de Sá, como afirma, leu o livro, os disparates da sua resenha só podem ser consignados ou à incompetência intelectual ou à má fé. São as alternativas.

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