São Paulo, terça-feira, 25 de outubro de 1994 |
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Jornalismo e ética
JOSÉ ROBERTO BATOCHIO
Sucede com a Folha um fenômeno singular. Seus leitores com ela se informam, se ilustram, se alegram, se irritam, se orgulham. O que explicaria essa relação umbilical entre a Folha e seus leitores? Por que nos sentimos um pouco donos, um pouco sócios, um pouco membros do jornal? A resposta é óbvia: ele é da cidadania, da sociedade, da democracia, de todos e de cada um. Aqui escrevo, pois, nessa especial condição de um dos milhões que se sentem seus ``donos". Tenho sido alvo de uma destrutiva campanha pessoal movida pelo colunista Luís Nassif. Provavelmente, ao lado deste texto, outro haverá, de sua autoria, com infundadas e ferozes agressões. A elas não mais responderei. No artigo que a Folha fez publicar na seção Tendências/Debates da última sexta-feira (21/10/94), respondi os principais pontos da matéria difamatória contra mim assestada. Gostaria de melhor aproveitar este espaço que me é concedido para propor algumas reflexões sobre o cenário dentro do qual se desenrolou essa lamentável sucessão de ofensas. Começo por sugerir, modestamente, um debate franco e aberto, que envolva Folha, seu ombudsman, profissionais e leitores, acerca das implicações éticas no jornalismo. 1) Tenho referido colunista na conta de empresário-jornalista –fenômeno híbrido e não-comum no exercício da comunicação social–, a merecer específica análise. Além de colunista da Folha, é ele proprietário da ``Agência Dinheiro Vivo", conceituada empresa de comunicação que presta serviços ao empresariado, à indústria, ao comércio, aos bancos etc. É oportuno que nos debrucemos sobre situação tão peculiar: alguém que, com a mão direita, escreve matérias sobre personagens a quem, com a mão esquerda, presta serviços. Como interpretar tal situação sob a perspectiva da ética jornalística? 2) Com que grau de insuspeição se oferecem as matérias tão incisivas por ele escritas contra, por exemplo, o novo Estatuto da Advocacia e da OAB, que atribui honorários da sucumbência aos advogados, impedindo o seu embolso por parte dos bancos e das empresas? Não é a esses empregadores que a empresa ``Agência Dinheiro Vivo" presta serviços? Dizemos no foro que é impossível encontrar imparcialidade em quem é juiz em causa própria! 3) Coloco mais um ponto para se refletir: deu-me conhecimento um catedrático da Universidade de São Paulo que recebera, dias atrás, correspondência circular, em papel timbrado da ``Agência Dinheiro Vivo", na qual era solicitado a ``dar apoio" a esse colunista, ``na campanha contra Batochio". A postura ética do professor de Direito endereçou-lhe um rotundo ``não". Diante de tal conduta, qual a credibilidade que o jornal pode carrear para as manifestações expressas no Painel do Leitor? Observa-se aí, por força da indesejável promiscuidade lucro-informação, a indébita interferência de elementos estranhos à função de comunicação social, usada para o mal, para a detração, simuladamente prestigiada por uma ``rede de solidariedade". Em juízo, é princípio consagrado que aquilo que é falso na parte deve ser tomado como falso no todo. Numa palavra: a inveracidade parcial envenena todo o arcabouço probatório! Ademais, idiossincrasias, ódios ou mesmo mera implicância pessoal não podem ter por estuário um órgão de comunicação social que cumpre o papel de realizar um direito fundamental: o acesso à informação qualificada, verdadeira. O ``estilo Chatô" morreu nas décadas 50/60, não pode estar redivivo, especialmente sem mecenato... Texto Anterior: A OAB e o álibi da cidadania Próximo Texto: Governo fará MP para facilitar importação Índice |
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