São Paulo, quarta-feira, 26 de outubro de 1994
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Câmbio e preço

ANTONIO DELFIM NETO

Antonio Delfim Netto
O velho Aldous Huxley disse uma vez que a ``experiência não é o que aconteceu com um homem. É o que ele faz com o que lhe aconteceu". Talvez seja por isso que, solitariamente, e com o risco de parecer antiquado, temos tentado chamar a atenção para os exageros que estamos cometendo com o câmbio. O BC foi longe demais na sobrevalorização do real, utilizando-o como instrumento de controle de preços.
Todos sabem que nos processos de estabilização há uma quase inevitável tendência à sobrevalorização lenta, consequência da persistência de uma inflação residual. Num prazo adequado, espera-se que haja uma acomodação da oferta, um aumento da produtividade do trabalho e um conformismo com os possíveis aumentos do salário real.
Uma vez feitos os fundamentais (equilíbrio orçamentário de médio prazo, administração adequada da dívida interna, taxas de juros parecidas com as externas, taxas de inflação do nível internacional), pode-se deixar o câmbio flutuar dentro de uma ``banda" relativamente estreita, com absoluta liberdade de movimento de capitais.
O sistema funciona razoavelmente (com sobressaltos nada desprezíveis) entre países que satisfazem certas condições, como se vê abaixo:
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É legítimo esperar um funcionamento eficiente do sistema de flutuação ``suja" (conhecida e desconhecida!) nessas condições, ainda mais com a garantia implícita de que o câmbio controla os preços?
Há duas taxas de câmbio: uma nominal e outra real. A taxa de câmbio nominal é apenas um dos elementos que influi na taxa de câmbio real. Esta é, efetivamente, a relação entre os preços de exportação e os preços de importação na mesma unidade monetária. Grosseiramente, o câmbio mede o número de ``pacotes" de importação que pode ser comprado com um ``pacote" de produtos brasileiros exportados. É a taxa de câmbio real que controla o saldo da balança comercial.
No longo prazo e em condições normais (diferenciais civilizados de taxas de juros, proximidades de taxa de inflação), a taxa nominal (determinada pela comparação do ativo dólar com o ativo real) e a taxa de câmbio real correspondente (que é um preço relativo) produzem o equilíbrio simultâneo no mercado financeiro e no balanço em contas correntes.
Temos sempre insistido que o objetivo do comércio exterior não é a exportação (que podemos produzir eficientemente), mas a importação que amplia o espectro produtivo, melhora a produtividade e fixa o padrão de qualidade do que não podemos produzir economicamente. Mas para importar é preciso exportar!
Quando há desenvolvimento, o dinamismo das exportações é a garantia da sua continuidade. O uso da taxa de câmbio para controlar os preços no curto prazo é a morte do crescimento no longo prazo.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

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