São Paulo, sexta-feira, 28 de outubro de 1994
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FHC visita cemitério e condena autoritarismo

CLÓVIS ROSSI

ENVIADO ESPECIAL A PRAGA

O presidente eleito Fernando Henrique Cardoso aproveitou sua visita de ontem a um antigo campo de concentração nazista para uma proclamação anti-autoritarismo.
``Esses episódios são terríveis e não devem ser postos à margem da história, não devem se repetir", disse o presidente eleito diante do portão de entrada do campo de Terezín (60 km a nordeste de Praga).
Falava para as duas emissoras brasileiras de TV e uma de rádio que cobrem sua viagem pela Europa, exatamente sob o arco em que se lia: ``Arbeit macht frei" (o trabalho liberta), sinistra frase colocada pelos nazistas em todos os campos de concentração.
A visita a Terezín foi proposta pelos próprios jornalistas, em busca de ``photo opportunities" (oportunidades para fotos) diferentes das de museus e igrejas que marcaram a viagem.
Mas o forte jamais foi utilizado em combate. Em 1940, com a invasão da Tcheco-Eslováquia pelos nazistas, virou o QG de Praga da Gestapo, a política secreta e política do nazismo.
À entrada da fortaleza estão as 26 mil sepulturas dos mortos no campo, alguns depois da guerra, por causa de uma epidemia de tifo.
FHC, a mulher, Ruth, e o embaixador brasileiro, Carlos Bueno, viram primeiro o cemitério, umgrande gramado pontilhado de lápides simples, todas iguais.
Depois, visitaram a prisão. Entraram em um dos alojamentos, em que há quatro beliches de três camas cada, acomodações portanto para 12 pessoas. Mas ali ficaram confinadas até 90 pessoas.
A sobriedade da visita só foi interrompida pela surpresa de uma turista brasileira, a carioca Simone Tenenbaum, que, depois de concluir estudos na França, viajou com a amiga canadense Julie para a República Tcheca.
Mal pôde acreditar quando viu o presidente eleito do Brasil caminhando pelo campo. Pediu autorização para que a amiga a fotografasse ao lado de FHC.
Depois do campo, o grupo foi ao ``Museu do Gueto", na própria cidade, talvez ainda mais impressionante. A cidade inteira foi transformada, durante a guerra, em um gueto para judeus de pelo menos 30 países.
O grupo viu um filme sobre a época, em que as autoridades nazistas tomam depoimentos em diferentes idiomas. Todos afirmam estar bem em Terezín. Os corpos magros e o confinamento desmentem os depoimentos.
``Nós no Brasil nunca tivemos nada semelhante, mas também passamos por uma fase de autoritarismo. Eu mesmo vi gente torturada", depôs FHC.
E condenou o autoritarismo: ``Agora que é passado, podemos voltar a isto não com a aflição de quem está próximo a uma situação de totalitarismo, mas com a tranquilidade de quem deseja lutar para que nunca mais haja algo semelhante".
FHC desembarca amanhã cedo em São Paulo.

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