São Paulo, domingo, 6 de novembro de 1994
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Leste Europeu tropeça nas reformas

OSCAR PILAGALLO
DA REPORTAGEM LOCAL

A crise do rublo, que despencou mais de 20% num só dia em outubro, expôs o alto grau de dificuldade da transição da Rússia para uma economia de mercado.
No caminho em direção ao capitalismo, o país tem andado para trás, produzindo menos a cada ano. Desde 1990, a produção industrial caiu pela metade.
Em outros países do Leste Europeu, a situação é menos dramática. Mas, se na maioria a fase mais dura das reformas liberais já passou, o exército de desempregados continua crescendo (veja a tabela).
Na Rússia, o pior pode estar por vir. O primeiro-ministro, Viktor Tchernomirdin, anunciou cortes no Orçamento de 1995 para reduzir o déficit dos 12% atuais para 8% do PIB (Produto Interno Bruto).
O objetivo da austeridade é a estabilização. A inflação, que caiu para menos de 5% em agosto –a mais baixa desde a reforma de 1992–, voltou a subir e já está na casa dos dois dígitos por mês.
A meta do governo é não passar de 2% ao mês no próximo ano. Poucos acreditam que seja realista, até porque a inflação será pressionada pela desvalorização do rublo, que encarece as importações.
Com o rublo sustentado por juros elevadíssimos, a crise cambial acabou sendo provocada pela insufiência de reservas internacionais, utilizadas como instrumento acessório para valorização da moeda.
O governo estuda acordo com o Fundo Monetário Internacional que atrelaria o rublo ao dólar.
Sem a estabilização, a Rússia está arriscada a ficar sem o crédito de US$ 14 bilhões que espera obter do FMI e de bancos privados.
O presidente Boris Ieltsin já liberou os preços e iniciou a privatização, mas tem pela frente alguns obstáculos para acabar de implantar as reformas econômicas.
Em primeiro lugar, há a limitação imposta pela própria economia. O governo sabe que não pode, agora, abrir mão do protecionismo, sob pena de extinguir sua indústria ineficiente e obsoleta.
Em segundo, a crise de outubro fortaleceu a oposição, que chegou a ameaçar o governo com voto de desconfiança. Embora não tenha passado, a moção teve apoio de quase dois terços dos deputados.
Além disso, o instinto de sobrevivência política de Ieltsin deve estar lhe dizendo que austeridade excessiva pode levar a um desastre eleitoral no final do ano que vem.
Mas nem todo o cenário é desolador. De tanto cair, é possível que a produção industrial tenha batido no fundo do poço. Depois de recuar 21% nos primeiros dez meses, subiu 6% em outubro em relação ao mesmo mês de 1993.
O país já estava em profunda recessão, com queda de 30% da produção neste ano, quando foi acertado em outubro um acordo com o FMI, prevendo mais austeridade.
O presidente, Leonid Kuchma, anunciou corte de subsídios e privatização, mas o plano terá que passar pelo Congresso, onde a oposição comunista tem grande peso.
Se o programa vier a ser implantado, a contrapartida será a liberação de um empréstimo de US$ 1,5 bilhão, que daria o sinal verde para a ajuda externa.
Os países que hoje desfrutam de melhores condições são os que primeiro embarcaram nas reformas.
O governo polonês, com um programa liberal que tem cinco anos, foi o pioneiro. Hoje prevê crescimento de 4,5% este ano, dose que seria repetida em 1995.
O crescimento da Polônia, que começou em 1992, está sendo puxado pelas exportações que aumentaram 23% até setembro, para US$ 10 bilhões. Mas a demanda interna, alimentada pelo aumento da renda, também é forte.
A privatização, que foi definida em outubro, deve completar as reformas. O número de empresas foi reduzido das 600 do plano original para pouco mais de 400, mas é o suficiente para atender ao FMI.
Quanto à República Tcheca, é o país que está com a economia mais em ordem. Tem a menor taxa de desemprego e o menor índice de inflação da região (veja a tabela).
Os tchecos saíram-se tão bem que, segundo a revista "The Economist", estão mais próximos das metas estabelecidas pelo Tratado de Maastricht –que estabelece pré-condições de integração na união monetária– do que alguns países da própria União Européia.
Separada da pobre Eslováquia em 1992, a recuperação da República Tcheca foi impulsionada por um dos mais radicais programas de privatização já realizados.
Atualmente, 80% dos bens que eram do Estado estão com a iniciativa privada. Cinco anos atrás, pouco antes do fim do regime comunista, a participação do setor privado era de apenas 2%.

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