São Paulo, domingo, 6 de novembro de 1994
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Onde a lei é respeitada

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Meus caros leitores hão de estar lembrados de uma célebre frase atribuída a uma grande liderança política da nossa nação: "Para os amigos, tudo; para os inimigos, a lei".
Acabo de chegar do "país das chibatadas" –Cingapura. A imprensa internacional divulgou amplamente o rigor com que se pune o desrespeito à lei naquele país.
Para os que viajam a Cingapura impressiona, de início, as informações que recebem antes para pedir o visto de entrada. O uso de droga é punido com pena de morte.
Antes de viajar procurei alguns amigos que estiveram em Cingapura. A impressão que levava era que o forte naquela nação era o comércio. Todavia, para minha surpresa, me deparei com grandes refinarias de petróleo e, para resumir, bastaria dizer que o consumo energético per capita naquele país medido em toneladas equivalentes de petróleo é cinco vezes maior que o brasileiro.
Quem dos meus caros leitores já se deparou com um grafiteiro? Como o grafite é muito caro e o emporcalhamento da cidade é feito pela madrugada adentro, acho que essa classe deve ser de gente com poder econômico e que não trabalha. Depois de uma madrugada de vandalismo ninguém está disposto a levantar cedo no dia seguinte.
Cingapura é um país pequeno, mas sério. Sua população não chega a 3 milhões de habitantes, mas a nação ocupa um dos lugares mais altos no Índice de Desenvolvimento Humano elaborado pela ONU. A vida média para os homens é de 70 anos e, para as mulheres, 76. O PIB ultrapassa US$ 50 bilhões, a dívida externa não chega a US$ 5 bilhões, a inflação é de apenas 3% ao ano e a renda per capital é de US$ 10 mil.
O que explica um país tão pequeno com uma renda tão alta –quatro vezes a nossa? É o binômio educação-trabalho. Em Cingapura, a educação básica é de boa qualidade e alcança quase 90% da população. Dois terços da força de trabalho têm mais de dez anos de escola. A ética do trabalho valoriza quem sua a camisa e enaltece quem se esforça. As jornadas são longas e bem trabalhadas. Entre nós, dois terços têm menos de quatro anos de escola e a educação básica é limitada e de má qualidade. E, no campo do trabalho, quem ganha sem trabalhar –na especulação e na intermediação– é tido como esperto e inteligente.
Esses dois ingredientes me parecem fundamentais para explicar tamanho contraste entre os dois países.
Não pensem que sou a favor das chibatadas, mas sim de multas pesadíssimas para quem sujar e perturbar a ordem pública inclusive nas praças de esportes hoje ameaçadas pela violência e pelo vandalismo. Caso não possam pagar, nada de os colocar na cadeia (pois ali quem os sustentam somos nós) mas sim exigir trabalho de limpeza em praça pública e a total recuperação dos estragos feitos nos estádios esportivos. Nesse aspecto, Cingapura é um exemplo de respeito à lei e à própria sociedade.

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