São Paulo, segunda-feira, 7 de novembro de 1994
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Gipsy King é o novo rei da MPB, nos EUA

MARCELO PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dia desses, engendrei um papo esclarecedor com uma jovem e bonita estudante universitária negra. É "negra" que se deve falar? Sei que "preto", no Brasil, é ofensivo. Já ouvi dizer que "mulata" vem de "mula".
Jorge Ben Jor usa "crioulo". Aqui é tudo invertido: "black" é tolerado e "nigger", nem pensar. "Creole" é a língua e culinária dos povos caribenhos. Aqui, você sabe, tem que dizer "afro-americano".
Um afro-americano não diz que é americano, mas "americanizado" e que não nasceu aqui por livre vontade. Diz que seus antepassados foram vendidos na África e forçados a vir etc.
Eu também não nasci por livre e espontânea vontade. Meus avós eram crianças quando foram enfiados num navio, na Itália. Aportaram no porto de Santos com falsas promessas. Trabalharam duro no interior do Estado de São Paulo, catando algodão e "otras cositas más".
Tudo isso para dizer que não sou brasileiro, mas abrasileirado. Abrasileirado? Que bobagem.

É humilhante ser caucasiano, homem e heterossexual por estas bandas. A todo tempo se escutam acusações, que os homens oprimem as mulheres, que os brancos oprimem os negros, que matamos os índios, que somos estupradores em potencial, que violamos os direitos dos homossexuais etc etc.
Juro que nunca bati na minha mulher, nunca matei um índio e adoro negão, aliás, "afro-brasileiro de tamanho grande". Minha sorte é que sou deficiente. Caso contrário, teria de pedir licença para repartir o mesmo espaço com tantos oprimidos.
Atualmente, o que dá mais prestígio, e está na crista da mídia, é dizer que sofreu abuso sexual na infância. Não vou perder seu tempo falando sobre isso.

Voltando à minha jovem e bonita estudante negra. Engatamos um papo esclarecedor sobre música. Por isso fiz questão de dizer que era negra, imaginando que um negro americano tem mais autoridade, sensibilidade e ouvido para falar de música.
Falei de como é a cultura brasileira, influenciada pela cultura africana. Falei de candomblé, da espada de Xangô, batuquei na mesa a batida de um samba carioca, de um samba de roda e do samba- reggae, imortalizado pelo Olodum e Timbalada.
Ela, encantada, disse que adorava música brasileira, especialmente o último disco do "Gipsy King". Minha resposta: "ah é? Bem..."
Marcelo Rubens Paiva está em San Francisco (EUA) como bolsista da Knight Fellowship, na universidade de Standford.

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