São Paulo, terça-feira, 15 de novembro de 1994
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Konchalovsky volta às origens com olhar irônico

Diretor fala sobre 'Ouro dos Tolos' no London Film Festival

ROGÉRIO SIMÕES
DE LONDRES

Depois de experimentar os prazeres e desgostos de Hollywood, o diretor russo Andrei Konchalovsky ("Os Amantes de Maria") decidiu voltar a filmar no seu país.
O resultado foi "Ouro dos Tolos" (Riaba, My Chicken), uma sátira à atual situação da Rússia. O filme mostra o cotidiano em uma vila no interior do país, onde as pessoas se recusam a abandonar o socialismo como base de suas vidas.
"Ouro dos Tolos" ainda não foi lançado na Rússia, onde deverá ser apresentado no final do mês na televisão, por decisão do próprio diretor.
No Brasil, o filme, que foi apresentado na 18ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, será lançado pela Look Filmes, em data indefinida.
Konchalovsky aproveitou a exibição no London Film Festival e concedeu entrevista coletiva sobre seu novo trabalho.
"Este não é um filme sobre mudanças, é sobre o que não mudou", afirmou o diretor. "É sobre a relação entre o homem e a sua sociedade."
A personagem principal de "Ouro dos Tolos" é Assya, uma defensora do comunismo, que sente saudades dos tempos de Brejnev. Sua grande companhia é a galinha Riaba.
A situação muda quando Assya encontra em sua casa um ovo de ouro. A possibilidade de melhorar sua vida muda seu comportamento em relação aos seus camaradas da vila.
Konchalovsky apresenta diversos elementos da atual sociedade russa: o crime organizado emergente, a inveja de moradores contra o vizinho capitalista e a indolência das pessoas acostumadas com o paternalismo estatal.
"Viver nos Estados Unidos me ajudou a conhece a Rússia melhor", disse Konchalovsky, que identificou no país uma completa falta de lei e ordem hoje. "É a sociedade mais livre do mundo". "Ouro dos Tolos" trata esses problemas com emoção e bom humor.
O filme foi feito no mesmo local em que Konchalovsky filmou "Assya's Happiness", em 1967. Como na primeira vez, o diretor trabalhou com os moradores, que interpretaram suas próprias vidas. Há apenas três atores profissionais em "Ouro dos Tolos".
"Tive que filmar cada cena com três câmeras. As pessoas não sabiam qual delas estava operando. Se soubessem, elas ficariam paradas, olhando para a câmera", afirmou.
O diretor disse estar satisfeito em voltar ao seu país de origem. "Eu prefiro fazer um filme como este do que uma produção de US$ 25 milhões", disse. "Eu estava completamente livre."
Ele vive a expectativa da reação do público russo ao seu novo trabalho. Segundo ele, alguns críticos que assistiram ao filme disseram: "Konchalovsky ficou tanto tempo no exterior que não conhece a Rússia."
O diretor conversou com Mikhail Gorbachev para que ele esteja presente num debate sobre o filme. O ex-presidente não confirmou a presença.
Com ou sem Gorbachev, a intenção de Konchalovsky é que as pessoas discutam o conteúdo do filme como se discutissem suas próprias vidas. Para, em seguida, pensar no futuro da Rússia.

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