São Paulo, terça-feira, 15 de novembro de 1994
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Procura-se indignação

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA – O brasileiro nunca foi personagem de grandes indignações. Apesar de alguns poucos lampejos de civismo, não se pode dizer que seja dado a fazer a própria história. Só recentemente aprendeu que sua ira, quando bem administrada, pode ser útil. Que o digam Collor e os anões do Orçamento.
Pois bem. A saúde e a educação estão aí a demandar uma revolta. Os dois temas clamam por um comício, uma passeata, um ato público em sua defesa.
Mas, embora estejam na raiz das mazelas nacionais, são assuntos que, curiosamente, empolgam tanto quanto uma partida entre o Madureira e o América do Rio. A verdade é que poucos se dispõem a gritar nas ruas pela saúde. Os cidadãos com ânimo para arregaçar as mangas pela educação não chegam a preencher os dedos de duas mãos.
Enquanto não ganharem as mesas de bar, hospitais e escolas não serão tratados com o devido respeito. É preciso que o brasileiro apalpe os temas, que sinta o bafo quente do problema a roçar-lhe a fronte.
Aqui faço uma autocrítica: a imprensa trata saúde e educação como assuntos de segunda. Os ministros dessas áreas são solenemente ignorados. Deveriam ser "perseguidos" com o interesse dedicado ao titular da Fazenda.
É de se perguntar: o que faz o Brasil que ainda não descobriu a importância da saúde e da educação? Ora, deteriora-se. Deveria ser negado ao brasileiro o direito de dizer "tudo bem".
Quando confrontado com o corriqueiro "como vai?", seria obrigado a declarar: "Muito mal". Um cidadão que não dispõe de eficientes sistemas de saúde e de educação não pode considerar-se "bem".
Como em toda eleição, não houve agora candidato que deixasse de prometer a melhoria de tais serviços. Enquanto esteve com o pé sobre o palanque, FHC prometeu gruindar o problema social à condição de prioridade.
Assim também com os novos governadores, os eleitos e os que ainda dependem da confirmação em segundo turno. Pois nada acontecerá se a deterioração social continuar despertando no brasileiro esse misto de passividade e inconsequência.

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