São Paulo, quinta-feira, 17 de novembro de 1994
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Acordo despreza mão-de-obra rural, afirma especialista chileno

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Zonas latino-americanas de livre comércio, como o Mercosul, menosprezam os interesses da mão-de-obra rural, que, sem a elaboração de reivindicações específicas, poderá ter acelerado seu seu processo de empobrecimento.
Essa é uma das advertências lançadas ontem, em São Paulo, por Jacques Chonchol, 68, ex-ministro da Agricultura do Chile (1970-1973) e ex-pesquisador do Instituto de Altos Estudos da América Latina da Universidade de Paris (1974-1994).
Convidado pelo Instituto de Estudos Avançados da USP, Chonchol argumentou, em conferência no Memorial da América Latina, que os trabalhadores rurais estão novamente em situação delicada.
Disse que, do início dos anos 70 até hoje, a agricultura no continente aumentou suas exportações anuais de US$ 7 bilhões para US$ 30 bilhões e conseguiu manter crescimento de 3% ao ano.
Mesmo assim, apenas entre 1980 e 1990, estudos da ONU revelam que os pobres e miseráveis no campo passaram de 56% para 61% no conjunto dos países da América Latina.
É uma maneira de constatar que a distribuição dos ganhos foi desigual entre proprietários e não proprietários de terras, e que o campo continua como um foco cada vez maior de tensão social.
A rigor, afirma Chonchol, o fenômeno correspondeu à repetição de um ciclo que a América Latina atravessou entre 1850 e 1930, quando a incorporação de novas áreas à agropecuária –como o pampa argentino– e a generalização da estrutura latifundiária permitiram a acumulação de riquezas e sua paralela má distribuição.
Mecanismos como o Mercosul, diz ele, se fundamentam na supressão de barreiras aduaneiras mas não instituem, como o faz a União Européia, políticas integradas de desenvolvimento agrícola.
Com isso, determinado país perderá a competitividade se der a seus trabalhadores direitos inexistentes no país vizinho, enquanto todos, em conjunto, tendem a ficar mais vulneráveis à concorrência de outros blocos ao escancararem suas fronteiras à exportação.
"Não basta crescimento econômico nem um esforço de integração regional, se não forem também abordados os problemas sociais de fundo", concluiu.
A conferência de ontem teve como debatedor Luiz Eduardo Wanderley (PUC-SP), que criticou o enfoque econômico dissociado das questões sociais e destacou a aparição de um novo conceito de "público" na atividade política, caracterizado por ONGs (Organismos Não-Governamentais) e por redes pelas quais elas se associam.

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