São Paulo, sábado, 19 de novembro de 1994
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A divergência que conta

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – A equipe econômica acaba de abrir uma discussão fundamental, graças à sensibilidade política primeiro de Tasso Jereissati, governador eleito do Ceará, e depois do ministro Ciro Gomes. Tasso serviu de ponte e Ciro aceitou discutir de peito aberto, com o empresariado industrial, o que os separa e o que os une.
Falta, agora, outro e mais importante passo: deixar claro para a sociedade o que é que se está discutindo. Reconheça-se que parte da culpa é dos jornalistas, que, não raro, preferimos o espetáculo à substância. O "canalha" e o "otário" com que Ciro brindou alguns empresários e alguns consumidores eram apenas o anedótico do episódio e, por isso mesmo, o irrelevante.
Relevante é a discussão em torno de política industrial, que o país não tem, o que a Folha ouviu tempos atrás em uma sala do próprio Ministério da Fazenda.
Passando das palavras em código à prática: a sobrevalorização do real, acoplada à redução das alíquotas de importação, transformou o Brasil "no país mais aberto do mundo", conforme o deputado Delfim Netto (PPR-SP) gosta de dizer e teve a coragem de dizer ao próprio Ciro.
Talvez seja exagero de Delfim. Mas tem o mérito de explicitar, com toda a clareza, qual é o sentido da discussão.
O empresariado industrial suspeita que o dólar barato mais a abertura supostamente indiscriminada produzirão de fato a estabilização da economia, numa ponta, mas, na outra, deixarão pelo caminho inúmeros cadáveres (de empressas e, por extensão, de empregos).
A equipe econômica diz estar atenta a eventuais excessos e se defende com dois argumentos: o valor do dólar não é fixado pelo governo, mas pela lei da oferta e da procura (como há abundante oferta, cai o valor da divisa norte-americana). E a abertura oxigena o ambiente econômico, ao forçar a indústria brasileira a tornar-se competitiva.
A discussão é determinante para o desenho do país que se vai construir no futuro imediato. Por isso é fundamental que a sociedade saiba do que se trata, até porque nada de duradouro se constrói sem algum grau de consenso.

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