São Paulo, domingo, 20 de novembro de 1994
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Psiquiatras testam drogas contra consumo exagerado

ROSIE MESTEL
DA "NEW SCIENTIST"

Nas semanas que antecedem o Natal, milhões de pessoas pelo mundo afora irão mergulhar numa orgia de gastar dinheiro.
Para a maioria de nós essa loucura é apenas sazonal, ou seja, própria dessa época.
Mas alguns infelizes sentem um desejo obsessivo de fazer compras o ano inteiro.
Agora, segundo alguns pesquisadores norte-americanos, pode haver medicamentos capazes de curar os compradores compulsivos de sua necessidade incessante de gastar dinheiro.
Donald Black, psiquiatra da Faculdade de Medicina da Universidade de Iowa, e Susan McElroy, psiquiatra da Universidade de Cincinnati, realizaram estudos piloto com compradores compulsivos –pessoas que não conseguem parar de fazer compras, mesmo sabendo que seu comportamento está provocando problemas sérios para eles.
Essas pessoas comumente gastam a maior parte de seus salários em artigos de uso pessoal.
Além disso, passam horas todos os dias planejando sua próxima saída às lojas.
Frequentemente acumulam dívidas de milhares de dólares, muitas vezes dão cheques sem fundos e excedem os limites de crédito de vários cartões de crédito diferentes. Às vezes provocam a falência de sua situação pessoal.
As pessoas levam o assunto na brincadeira, mas na realidade o problema é sério, diz McElroy.
A natureza da compulsão para comprar provavelmente se assemelha muito a uma série de problemas psiquiátricos conhecidos como distúrbios do controle de impulsos.
Esses distúrbios incluem o desejo incontrolável de provocar incêndios, roubar ou arrancar os próprios cabelos.
Mas também se assemelha ao distúrbio obsessivo compulsivo (DOC), no qual as pessoas repetem determinadas tarefas –como lavar as mãos, por exemplo– incessantemente, até o ponto em que o ato perde o sentido.
Outro exemplo de vítimas de um desses distúrbios é o de pessoas que economizam dinheiro obsessivamente.
A semelhança entre a compulsão para comprar e o DOC levou Black a testar o medicamento fluvoxamina nos compradores compulsivos.
A substância já está sendo usada no Reino Unido para tratar casos de depressão.
Nos Estados Unidos, aguarda aprovação da FDA (agência que regulamenta remédios e medicamentos) para ser usada no tratamento de DOC.
No estudo de Black, os pacientes tomam o remédio durante oito semanas, e o efeito sobre sua compulsão para comprar é monitorado de forma constante.
Depois eles param de tomar o medicamento e passam mais um mês sob observação.
Segundo Black, nos sete pacientes testados até agora os resultados foram dramáticos e inequívocos: a compulsão deles por comprar e o tempo gasto fazendo compras reduziram muito.
Mas quando o paciente pára de tomar o remédio, os sintomas retornam gradativamente. Os resultados são excepcionais, diz Black. Acho que o medicamento é realmente promissor.
A fluvoxamina não é o único medicamento que poderia ajudar os compradores descontrolados.
Num estudo do histórico médico de 20 compradores compulsivos, McElroy e seus colegas constataram que remédios antidepressivos como a fluoxetina (Prozac) e a sertralina (Zoloft), usados para tratar tanto depressão quanto DOC, parecem beneficiar também os compradores compulsivos.
Os remédios constantes do grupo de estudo de McElroy foram tomados originalmente para tratar a depressão, que frequentemente acomete os compradores compulsivos. Mas nove em cada 13 compradores compulsivos relataram que a compulsão para comprar também diminuiu enquanto tomavam esses medicamentos.
Tanto Black quanto McElroy ressaltam que suas descobertas são apenas preliminares, e que é preciso fazer experiências maiores para que se possa tirar qualquer conclusão determinante. Ambos planejam realizar essas experiências.
Mas isso não significa que 15 milhões de norte-americanos devam tomar remédios para reduzir seus gastos com compras, diz Black. Acho que o número de pessoas que precisaria realmente de tratamento medicamentoso seria mínimo", diz ele.
Tradução de Clara Allain

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