São Paulo, domingo, 20 de novembro de 1994
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Juros ameaçam os mercados emergentes

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Ganhou força a partir de 1990 e virou uma febre. Os "emerging markets" (mercados emergentes), especialmente na Ásia e na América Latina, receberam até 1994 cerca de US$ 113 bilhões apenas em capitais privados.
Segundo o Banco Mundial, essa nova onda repõe os níveis de 1980, anteriores à crise da dívida. Mudaram as formas de investimento. Nos anos 70 predominavam os empréstimos bancários. Da onda recente participam empresas transnacionais, investidores em Bolsas, fundos de pensão, companhias de seguros. E bancos.
Mas não se sabe ainda se esse novo ciclo de globalização financeira é duradouro ou seguro. A dúvida aumentou muito depois que o Fed, banco central dos EUA, foi ao longo de 1994 elevando as taxas de juros. Os mercados emergentes sentiram o baque, ensaiaram uma recuperação, mas passaram a inspirar maior cautela entre os investidores.
Alguns fatores contam a favor da estabilidade. Em primeiro lugar está o aumento na participação dos investimentos diretos nesses fluxos globais. Hoje, 50% dos capitais que se dirigem às economias em desenvolvimento são investimentos "reais", e não jogadas financeiras. Supõe-se que o dinheiro que se transforma em fábricas fica mais parado, é mais estável comparado ao que vira títulos.
Outro fator que reforça a incorporação dos mercados emergentes nos circuitos globais é puramente financeiro. Num mundo cheio de assimetrias, com desenvolvimento desigual, é mais seguro colocar os ovos de ouro em várias cestas. Como a concentração de ovos no Primeiro Mundo ainda é enorme, as estratégias de diversificação de riscos poderiam por si mesmas levar a mais investimentos nos mercados emergentes.
O contraponto negativo mais citado ainda é a própria instabilidade política e econômica desses mercados. Um assassinato político no México ou uma penada de um burocrata chinês são riscos que ainda é prudente considerar. E os riscos de pânico contagiante nos mercados financeiros globais não são desprezíveis.
O aumento dos juros nos EUA, entretanto, aparece como elemento fundamental. Afinal de contas, a febre dos mercados emergentes está associada a novas formas de globalização financeira, mas isso não significa que a velha "dívida externa" tenha simplesmente sumido do mapa. Juros internacionais crescentes continuam sendo sinônimo de piora nas condições dos emergentes, que são ainda, também, endividados.
Se a elevação dos juros jogar a economia mundial numa recessão, os endividados incapazes de manter saldos no comércio exterior vão gerar ainda mais intranquilidade. Pelo menos até agora, esse risco parece afastado. Os juros nos EUA sobem para impedir a inflação, mas não há sinais de desaceleração na economia americana.
Para alguns economistas, o risco existe apenas se ocorrer um choque de juros. Elevações graduais teoricamente dariam tempo para as economias emergentes se ajustarem sem traumas. Durante esse tempo poderiam ser adotadas, por exemplo, políticas menos expansivas, de apoio a exportadores ou desestímulo às importações.
Na teoria, entretanto, há sempre tempo para tudo. Na vida real, o tempo devora os aprendizes.

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