São Paulo, terça-feira, 29 de novembro de 1994
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Pai de estudante chama índio de monstro

CRIS GUTKOSKI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM REDENÇÃO

"Monstro" e "marginal". Eram duas palavras repetidas com insistência ontem pelo pai da estudante Silvia Letícia Ferreira, Valdemir Ferreira, 62. Ele e a mulher, Selvina, 55, acompanharam a leitura da sentença que absolveu Paulinho Paiakan e, ao final, se declararam revoltados e surpresos. Paiakan e a mulher, Irekran, eram acusados de estupro e atentado violento ao pudor contra Letícia.
Na sentença, o juiz Elder Costa criticou várias fases do processo e chegou a defini-lo como "balbúrdia jurídica". "Não há defesa que resista a tantos impropérios", afirmou Costa, referindo-se à troca constante dos advogados de Paiakan (ao todo foram oito).
O juiz apontou falhas nos laudos de corpo de delito para mostrar que eles não comprovaram a acusação de estupro.
"Não acredito na podridão da Justiça, que aqui só funciona para ladrão de galinha", disse Ferreira. A mãe da estudante não entendeu a alegação da Justiça de que faltaram provas para condenar o casal. "A minha filha tem manchas roxas no corpo que vão durar até a morte", disse Selvina.
"Mesmo com tudo o que eu sofri, valeu o reconhecimento pelo direito que todos nós temos", disse Paiakan ao cumprimentar o juiz. "Volte para o seu povo", disse Elder Costa em tom solene.
O juiz chorou ao ler a última página da sentença, em que uma citação do jurista Mário Guimarães afirma que a "Justiça justa" nem sempre é a mais rápida, mas a mais segura.

Segurança
A Polícia Militar do Pará e a própria Funai (Fundação Nacional do Índio) temiam que uma possível condenação de Paiakan resultasse na revolta dos índios caiapós e em grande tumulto no município de Redenção. A venda de bebidas alcoólicas estava proibida desde a véspera da leitura da sentença.
"Soubemos que a aldeia estaria preparada para a guerra caso ele fosse condenado e recolhido para a prisão", disse o major Severino Fontin, 42, que coordenava um batalhão de 300 soldados da PM, distribuídos nas proximidades do fórum e da Câmara Municipal.
O cacique Ireô, 37, um dos cinco líderes indígenas que acompanharam a leitura da setença, negou que os caipós estivessem preparando uma revolta.

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