São Paulo, quarta-feira, 30 de novembro de 1994
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O "modelo brasileiro"

JANIO DE FREITAS
O "MODELO BRASILEIRO"

Caso único, dentre todas as cidades brasileiras, de estudos internacionais como modelo de modernização com bem-estar urbano, Curitiba torna-se agora o melhor símbolo da modernidade à brasileira. Enquanto se modernizava por um lado, por outro Curitiba levava um terço das crianças que a habitam a níveis de desnutrição comparáveis aos do Nordeste.
A pesquisa que o Conselho de Segurança Alimentar –Consea– está divulgando é muito mais do que um retrato da desnutrição infantil: é um retrato sem retoque do Brasil que vem sendo feito (e continuará sendo, ao que se prenuncia) pelo economismo tecnocrata. Para o qual R$ 1,4 bilhão em socorro a um banco (ou, com mais precisão, aos seus banqueiros) mais se justifica do que a metade disso em socorro aos hospitais públicos. Dispenso-me de outros exemplos: Curitiba, a moderna e rica e aprazível Curitiba os sintetiza todos.
A luta pela imagem
Mesmo quando sua paciência se encurta, e às vezes se justificaria que acabasse de todo, o general Gilberto Serra consegue controlar a situação e, no mínimo, conter algum desgaste para o Exército. Foi de muitos, nos últimos anos, o esforço de recuperação da imagem do Exército, mas nele o general Serra tem mantido relevo especial, desde que assumiu a chefia do Centro de Comunicação Social do Exército, o Cecomsex.
Chamo a atenção do leitor para a eficiência inteligente e audaciosa com que o general Serra interveio agora para neutralizar uma bomba, lançada pelo próprio ministro do Exército. Bomba duplamente espantosa, pelo teor e pelo autor. Até então comedido sempre, o ministro Zenildo Lucena reagiu às queixas do padre Olinto Pegoraro, contra a desnecessária ocupação de sua igreja no morro do Borel, dando-o publicamente, só pela queixa, como suspeito de ligação com o banditismo.
A CNBB nem teve tempo de articular a resposta, com peso à altura do motivo. Logo o general Serra, numa atitude quase impensável em militares, telefonava a d. Luciano Mendes de Almeida para pedir a colaboração da Igreja na fiscalização das ações militares e para a própria eficácia da operação em geral. Sua habilidade reteve no nascedouro um problema daqueles, juntando a violência verbal contra o padre à violência torturadora contra moradores do Borel. Com essa habilidade incomum nos de sua formação, o general Serra tem obtido efeitos não menos inesperados.
Faço esse registro com a isenção realçada por saber que não sou apreciado pelo general –o que não é uma exceção para os generais, nem para mim. Tivemos há tempos, por alguma coisa publicada aqui, uma conversa telefônica que ambos preferiríamos mais comedida.
"Status"
Sem tanques, sem urutus, sem toque de recolher, sem helicópteros de combate, sem contingentes enormes, a Polícia Civil entrou na favela de Vigário Geral e lá recolheu mais armas de guerra e prendeu mais traficantes comprovados do que em todas as ações militares até agora.
Aí está uma forte razão para os militares refletirem sobre a conveniência, ou não, de continuarem excluindo de suas ações os policiais decentes e mais habilitados. A exclusão vem acontecendo porque os militares acham que ações conjuntas impregnariam de conotação policial a sua participação, retirando-lhe o desejado "status" militar.

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