São Paulo, quinta-feira, 8 de dezembro de 1994
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O FHC inteligente e o vaidoso

LUÍS NASSIF

Há duas entidades habitando Fernando Henrique Cardoso: o vaidoso e o inteligente. Recentemente, uma delas acalmou a opinião pública, garantindo que o inteligente superaria o vaidoso. O que parecia manifestação de bom senso do inteligente, era falsa modéstia do vaidoso.
Fortalecido pelo sentimento de onipotência que acomete candidaturas vitoriosas –e inícios de planos de estabilização–, o FHC vaidoso criou um eufemismo chamado de equipe econômica, para garantir seu direito de atravessar quatro anos de mandato em meio a tertúlias acadêmicas e saraus literários, sem o risco de ser interrompido por esses chatos que teimam em perseguir transformações no mundo real.
A equipe teria vetado o nome do senador José Serra para o Ministério da Fazenda. Mas que equipe é essa?
Winston Fristch, que não chegou a ser, não mais será. Edmar Bacha só aceitou a presidência do BNDES de favor (dele ao amigo FHC). Clóvis Carvalho ficando na Fazenda ou no Planalto, defende Serra. Pedro Malan foi empurrado para o cargo de Ministro da Fazenda e é dono de educação tal que jamais se ouvirá dele vetos a quem quer que seja.
O novo presidente do Banco Central, Pérsio Arida, não só gosta como quer Serra. Enquanto que o diretor da Área Internacional do BC, Gustavo Franco não quer Serra, mas tão pouco queria Arida, que será seu chefe e também não o quer. Se Franco tivesse o peso do veto, seria ele, e não Arida, o novo presidente do BC.
Acadêmico é um bicho ciumento e complicado, mas o veto a Serra não parte da equipe. Parte do acadêmico-mór, FHC.
Amigo de Serra, FHC tem contra ele as mesmas ressalvas de todos os demais presidentes que não o quiseram no cargo. Serra é carga pesada. Não faz concessões, é persistente até o limite da chatice, não tem a atração da popularidade fácil, é personalista e atropela quem estiver à frente de seus projetos de estabilização. Tem todos os defeitos necessários para avalizar o processo de estabilização.
FHC parte da visão errada –e pequena, para intelectual da sua envergadura– de que indicar Serra para Fazenda seria compartilhar com ele do mérito da estabilização. Está errado.
Há dois desafios pela frente: o da estabilização e o da busca do crescimento. Os benefícios da estabilização foram colhidos por FHC ao decidir trocar a moeda e comemorar a vitória no campeonato, antes do início.
Agora, entra-se na fase dura em que todo o bem já foi feito, e o mal terá que ser praticado diariamente, no enfrentamento das resistências ao plano. E quem vai enfrentar? FHC com seu estilo de não descontentar ninguém? Com sua falta de afinidade com rotinas?
Se o FHC vaidoso permitisse, o FHC inteligente iria se dar conta de que o melhor seria deixar o trabalho de britadeira nas mãos de um ministro da Fazenda peitador, reservando para si a parte mais criativa de sua gestão: a de exercitar o discurso do desenvolvimentismo.
A tarefa exige presidente com traquejo internacional, capaz de vender o Brasil ao exterior. Com o dom da palavra, para elaborar um novo discurso desenvolvimentista. E com grandeza para não permitir que sentimentos mesquinhos reduzam a margem de segurança de que o país necessita para completar a travessia.

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