São Paulo, domingo, 11 de dezembro de 1994
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Constituição preserva a moralidade administrativa

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O artigo 37 da Constituição impõe aos administradores públicos que cumpram a lei e, mais que isso, atuem dentro dos princípios da moralidade.
Se o leitor não sabia, fique sabendo: a moralidade dos atos praticados pelos servidores públicos é preceito ético, inerente ao bom comportamento de cada servidor, mas é também preceito constitucional.
Fatos recentes da vida brasileira trouxeram o tema do debate sobre a insuficiência da legalidade, para redimir a ofensa dos preceitos morais. O ministro Milton Luiz Pereira, do Superior Tribunal de Justiça, tem estudo completo sobre o tema, divulgado na revista "Genesis", de direito administrativo, onde pondera que a moralidade administrativa, princípio indisponível de origem pública, reclama o bom combate de sua reparação, até com ousadia, pois, como anota, "a dinâmica social, a respeito, não perdoará o silêncio".
A confusão entre moral e direito (trato de condutas legais, mas não éticas) cria dificuldades para os juristas quando querem aplicar regras de moralidade a comportamentos legítimos. Um bom começo está na certeza de que todo ser humano, provido de personalidade e de capacidade, pode e deve distinguir entre o bem e o mal.
Trata-se apenas de um bom começo, pois o ser humano –sobretudo o poderoso– sempre encontra meios de justificar condutas, conforme as conveniências do momento, possibilitadas pela fluidez conceitual das razões éticas.
Segundo elemento distintivo decorre do sujeito ativo da conduta. Tratando-se de um ente privado que descumpra deveres éticos, a punição assume formas de sanção social. Há, ainda, exemplo de sanções legais –baseadas em forte caráter ético– na relação de consumo entre fornecedores de bens e serviços e os destinatários finais deles.
Na administração há duas ordens de consequência do desvio ilegal dos preceitos morais. Uma delas atinge a administração em si mesma, pela perda de respeito diante do povo e pelo direito, do ofendido, de obter reparação do dano sofrido. Outra atinge o servidor, que –depois de processo regular– é punido com a demissão (se nomeado por concurso) ou com a cassação (se eleito).
Para a primeira das consequências mencionadas há uma novidade no direito constitucional brasileiro, com um meio hábil à disposição dos cidadãos: a ação popular. Esta cabia para punir danos contra o patrimônio público. A partir de 1988 passou a valer também para anular ato lesivo à moralidade administrativa.
Quando o Poder Público seja condenado a indenizar quem sofreu dano consequente de atuação moralmente ilegal de servidor público, a consequência nasce com o direito regressivo. Ou seja: o Estado responde pelo dano e paga a indenização. Se o agente público agiu com dolo (teve a intenção de prejudicar) ou culpa (foi imprudente, negligente, imperito) o Estado pode cobrar do responsável, de volta, o que gastar. Milton Luiz Pereira trata, no estudo indicado, da moral institucional que transcende do limite legal das atribuições dos servidores. Para eles os preceitos da moralidade administrativos vigora de dentro "do próprio ambiente institucional e condicional a utilização de qualquer poder jurídico, mesmo o discricionário".
Resolveremos a dificuldade quando se firmar o conceito de que o universo da moral é mais amplo que jurídico e que a satisfação dos requisitos do universo menor devem satisfazer os do maior. Tudo rigorosamente apurado segundo o devido processo legal.

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