São Paulo, domingo, 11 de dezembro de 1994
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AL usa câmbio para estabilizar economia

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O Chile promoveu uma maxivalorização cambial de 10%. A notícia passou meio desapercebida por aqui, mas trouxe imensa alegria a muitos argentinos. Com o peso ainda mais valorizado, ajuda ver um competidor externo disposto a encarecer suas exportações.
Para o Brasil, entretanto, que ensaia os primeiros passos num novo regime cambial, fica a dúvida: ingressamos logo numa paridade fixa, à la Argentina, ou usamos mais o caminho chileno, até valorizando mais o real se for o caso?
O Chile tornou-se, após seu ajuste estrutural, uma economia eminentemente exportadora de produtos primários, da madeira ao salmão. O ajuste exportador privilegiou essa especialização produtiva. Mas o regime cambial é de valorização da moeda local, ou seja, erosão da competitividade externa.
A Argentina de certa forma é um exemplo de regime cambial oposto, mas com resultados igualmente discutíveis.
O ajuste inteiro repousa sobre a estabilidade nominal da taxa de câmbio. É um peso por dólar, há três anos. O movimento de capitais é livre, e o enorme afluxo de recursos externos deu-se na proporção em que aumentava o déficit comercial. Agora o déficit tornou-se monstruosamente assustador e de difícil reversão. A taxa de câmbio fixa perde credibilidade.
Há três semanas ninguém menos que John Reed, célebre xerife da dívida nos anos 80, disse que o peso argentino precisa ser desvalorizado. Três anos de privatização selvagem depois, ainda não há ajuste fiscal suficiente para tranquilizar os investidores externos.
Esses exemplos mostram que a opção por câmbio fixo ou flutuante não é trivial nem tem sucesso evidente. Mas no Brasil o debate do câmbio virou um Fla-Flu.
A regra cambial, a tal "âncora", é fundamental num processo de estabilização com reinserção internacional. Mas como dizia Pedro Malan nos anos 70, não se pode querer que o rabo abane o cachorro. O câmbio só se sustenta e tem credibilidade, se outras regras forem explicitadas e cumpridas.
A primeira regra é a capacidade do Banco Central responder aos movimentos especulativos do mercado. Mas esse é apenas o começo. No México, por exemplo, a crise depois do assassinato do candidato Colosio contou com uns US$ 6 bilhões providenciados pelos EUA.
Na Argentina e no Chile há políticas externas explícitas de integração ao Nafta. Em Miami espera-se o anúncio da entrada do Chile no bloco econômico.
Os Estados Unidos cumprem um papel central na liberalização do comércio mundial e querem reciprocidade. Nos últimos anos assiste-se a uma verdadeira batalha campal quando se trata de política de comércio exterior dos EUA.
As Américas, como um todo, embarcaram no projeto de liberalização, uma aposta política e estratégica que passa pela reinserção das suas economias num circuito regional. Visto como rito de passagem rumo a um sistema global.
Chile e Argentina, cada um a seu modo, ajustaram-se e estabilizaram-se em consonância com a estratégia liberalizante.
A capacidade de sustentar um déficit comercial ou a coragem de valorizar a própria moeda em 10% têm a ver com essa aposta. Aposta estratégica, que o Brasil ainda não chegou a fazer claramente.

Texto Anterior: Independent; Asahi Shinbum; China Times Express; The Washington Post
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