São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 1994
Próximo Texto | Índice

Independência ou morte

Das muitas providências que ainda se fazem necessárias para garantir rumo seguro à estabilização brasileira, provavelmente a maioria se situa no campo da reforma institucional. O país não apenas se acostumou à inflação, como também forjou regras e costumes inflacionários. Não é possível romper com o passado se não se substituírem as instituições do passado.
Conquistar a independência do Banco Central é um dos maiores desafios. A roleta de diretores e presidentes dos últimos anos já diz muito das dificuldades em causa. Ajudaria, por exemplo, definir regras que garantissem estabilidade às equipes que se ocupam de defender a moeda. Seria útil que os mandatos dos diretores do Banco Central e o do presidente da República não mais coincidissem.
Reformar instituições, entretanto, não equivale a escrever novas regras. Em particular no Brasil, onde já é praxe perguntar primeiro se uma nova regra vai ou não "pegar".
Para "pegar", a independência do Banco Central deve ser muito mais que uma frase a mais na já prolixa Constituição ou mesmo outra regra de eleição e renovação da diretoria do banco. Afinal, a independência que se deseja não é apenas política, ritualística ou processual, mas substantiva, do ponto de vista puramente econômico.
Isso significaria garantir, em primeiro lugar, independência em face do Tesouro. O pecado maior é um banco central imprimir dinheiro para tapar os rombos de um Tesouro financeiramente incontinente.
Portanto, é preciso produzir um profundo e duradouro ajuste fiscal antes de tentar chegar a um BC não apenas subjetiva, mas objetivamente capaz de ocupar-se prioritariamente da defesa da moeda. Assim seria possível ao BC fazer política monetária, em vez de ver-se reduzido a administrador de um setor público estruturalmente endividado e cronicamente deficitário.
No caso brasileiro, poucas coisas serão hoje mais óbvias que a precariedade do ajuste fiscal realizado em 1994. É importante propor a independência do BC. Mas fazer disso uma obsessão formal sem o ajuste fiscal substantivo é o mesmo que gritar "independência ou morte" sem de fato encarar o inimigo de frente e por inteiro.

Próximo Texto: Mais que Mercosul
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.