São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PT –derrota ou vitória?

Florestan Fernandes
Vítima de estereótipos ultranegativos, o PT atravessou a campanha eleitoral acuado pelos ricos e privilegiados.
Lula distinguiu-se pelas tentativas que realizou para alterar imagens que não correspondem à lógica política de um partido de trabalhadores. Travou diálogos com todos os estratos sociais adversos. Resultado final: constataram que ele havia "amadurecido"!
Ultrapassadas as eleições, os mesmos estereótipos voltam à tona para proclamar que o PT emergiu como o grande derrotado.
Ora, pelos padrões vigentes trata-se de uma inversão. Viram o PT de cabeça para baixo e diagnosticam uma crise próxima, nascida da derrota e de divisões internas. Estas têm origem em sua organização democrática e no fato de o partido não possuir um "dirigente supremo".
Lula submete-se à disciplina resultante de opções majoritárias e o partido não é infestado por cúpulas que negociam em seu nome. Ao contrário do que prevalece como a vontade dos chefões e financiadores em outros partidos.
Ganhar ou perder são os frutos naturais do crescimento oscilante, prolongado e difícil, sob o peso da estigmatização antioperária.
Lula aperfeiçoou-se como líder político. Sai das eleições com as faces limpas e com o prestígio aumentado por sua campanha civilista para os subalternizados e pela votação expressiva que colheu, sem amparos oficiais, doadores generosos e o patrocínio da mídia.
Firmou-se sobre seus pés e pode tentar de novo, se essa for a sua vontade e a decisão das bases reais do partido.
O PT conta agora com 46 deputados federais, cinco senadores e dois governadores. As pressões destrutivas não lograram "sufocar" o partido.
Há críticas de petistas que reclamam das relações com os demais partidos da coligação à esquerda. Elas procedem de uma visão vesga da realidade: o PT teria perdido posições, transferidas aos aliados. Mas as articulações deviam desenrolar-se dentro da esquerda, para aumentar o peso do bloco político em suas atividades parlamentares. E quantos votos seguiram a direção inversa, favorecendo o Partido dos Trabalhadores?
Dizem que em política não há meia vitória nem meia derrota. O raciocínio é circular. Um partido com crescimento entravado recebe a meia vitória como vitória efetiva. A médio prazo, isso indica a proximidade de vitórias consagradoras.
Não quero dourar a pílula... Um partido operário, com origens e rumos socialistas, não pode priorizar o êxito eleitoral como fim primordial.
Nesse nível, existe, de fato, um vinco de derrota. Deslocamentos para o centro ou à direita são preços altos demais. É inútil fazer concessões, através de "candidatos confiáveis", para uma maioria hostil conservadora.
O esforço principal incide na politização de milhões de oprimidos e na universalização da cidadania. A soberania popular não deve constituir uma patranha constitucional. É nesse terreno que o PT precisa vencer!
Florestan Fernandes escreve às segundas-feiras nesta coluna.

Texto Anterior: Um jardim para Tom
Próximo Texto: A PROPÓSITO; ITAMAR E FHC; SELEÇÃO À VISTA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.