São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 1994
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O Q.I. dos negros

MARCO SEGRE

Não sei se o trabalho dos norte-americanos que concluíram ser o Q.I. dos negros, em média, inferior ao dos brancos tem qualquer fundamento científico. Mas a celeuma que a simples referência a essa pesquisa desencadeou no mundo, esta sim demonstra como existe na sociedade o medo da discriminação de etnias –sendo que esse medo tão agudo é a evidência mais cristalina do racismo que existe em quase todas as pessoas.
Volto a dizer: pode ser que seja tudo "besteira", mas e se não for? E daí? Por que essa "Q.I. latria", na qual um simples indicador de "inteligência", elaborado para fins específicos que podem nada ter que ver com o sucesso pessoal e profissional, por que a simples possibilidade de grupos diferentes reagirem diversamente a um certo tipo de estímulo desperta tanta angústia?
É o medo da discriminação de grupos... Hitler e seus cúmplices aí estiveram, demonstrando a gigantesca intolerância com relação às pessoas que, de alguma forma, tinham características diferentes das demais. Aí está o cerne do racismo, gerado pela não aceitação de todo homem que tenha algo diferente quanto ao aspecto físico, mental, afetivo ou social.
São rótulos, são os eternos rótulos, com os quais os "cientistas" pretendem "classificar" a espécie humana. É a eterna necessidade de se estabelecerem padrões, atribuindo-lhes valores, cuja emulação fica sendo o principal objetivo, em busca da "normalidade", do "adequado", do "politicamente correto". Filme recente, "O Contador de Histórias" ("Forrest Gump") enfoca magistralmente essa febre.
O ser humano não é um "uísque" (red e black label), ele não pode ser definido por rótulos, seu conteúdo é multifacetado, assombrosamente rico, inefável e imponderável em muitos de seus aspectos, justificando a conhecida frase de Alexis Carrel: "O homem, este desconhecido".
Inteligência não se avalia por um indicador, sendo ela integrada de uma infinidade de aspectos, onde a sensibilidade e a percepção, ao lado da memória e associação de idéias, têm papel de destaque.
O que teria de mais se os membros de uma etnia tivessem o Q.I. mais ou menos elevado? Sempre no âmbito da "psiche" humana poderíamos, então aplicar, em todos os grupos os testes de Rorshach, Pfister, T.A.T. e tantos outros, e par de medirmos sua estatura, volume do crânio, inclinação da bacia, proeminência das mandíbulas e daí em diante! Ou, então, ao que se depreende das pesquisas do projeto genoma, pelas características e localização de cada um dos milhares de gens que vão sendo identificados!
Será que assim estabeleceríamos qual ou quais seriam os homens melhores? É claro que não, e todos os que assim pensam demonstram que, no plano humano, eles são, no mínimo, uns grandes imbecis.

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