São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 1994
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Mais dois jovens se matam no Japão

DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

Dois adolescentes se enforcaram no Japão nos últimos dois dias, um deles deixando uma nota em que denunciava maus-tratos por parte de colegas de escola.
As mortes elevam a quatro o número de jovens que se suicidaram nas últimas três semanas.
Esse é o tema mais discutido na imprensa do país; anteontem, ele foi objeto de debate especial do gabinete de governo japonês.
No caso de ontem, um garoto de 14 anos foi encontrado enforcado numa viga em sua escola em Yorii, 50 km a sudoeste de Tóquio.
Segundo a polícia, ele deixou uma nota dizendo: "Tem ocorrido uma série de suicídios causados por abusos denunciados na mídia, mas o meu é apenas uma experiência. Só quero verificar se a gente vai para o Céu ou para o Inferno".
Anteontem, um garoto de 15 anos foi achado enforcado numa árvore perto de sua casa em Fukushima, 240 km a nordeste de Tóquio. "Faz três anos que me maltratam", escreveu o estudante da Escola Secundária Ishikawa.
"Eu culpo essas pessoas", dizia a nota, acusando três colegas de escola que o teriam submetido ao chamado "silêncio frio" (ignorar sistematicamente uma pessoa, como se ela não existisse).
No mesmo dia o governo liderado pelo premiê Tomiichi Murayama fez uma reunião especial para discutir o assunto.
Segundo o Ministério da Educação, somente em 1993 foram registrados 21.598 casos de "ijime" (maus-tratos) entre estudantes nas escolas japonesas.
O ministério acredita que o número real deva ser maior, pois muitos casos não são denunciados.
"Há muitos casos de 'ijime'. Mas a cobertura maciça da mídia pode ter destruído o precário equilíbrio psicológico de algumas vítimas, levando-as ao suicídio", comentou o psiquiatra Inada Nada.
Para ele, alguns adolescentes podem ter-se convencido de que não tinham nada a temer em relação ao suicídio ao ver que outras vítimas de maus-tratos preferiram a morte a enfrentar novos abusos.
Especialistas acham que a culpa é do sistema educacional japonês, em que alunos são pressionados a tirar boas notas com aulas extras à noite e nos fins-de-semana.
"A pressão é aliviada através do 'ijime' contra colegas ou com atos de violência em casa", disse o ex-professor Kazuhiro Mochizuki.
Funcionários da escola Ishikawa disseram que sabiam que o garoto, cujo nome não foi revelado, estava sendo submetido a ostracismo.
"O que não sabíamos é que a coisa era tão séria", disse o diretor Eiichi Tanase em reunião com os 760 estudantes da escola. "Devo pedir desculpas", acrescentou.

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