São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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União do Mercosul ainda esbarra na falta de infra-estrutura

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Afinal, o momento é de globalização ou regionalização?
O Estado nacional, palco da modernização, parece vitimado para sempre pela crise fiscal, pela reestruturação produtiva e pela flexibilização financeira.
Reengenharia, "downsizing", terceirização, quarteirização, subcontratação, informatização, "networking", flexibilidade –nunca se abriu tantas frentes de transformação organizacional ao mesmo tempo sob um imperativo tão avassalador.
Mas, na contracorrente, há também quem alerte para a ilusão infantil que confunde concorrência empresarial e competitividade nacional, criticando a visão que transforma a história do mundo num jogo de futebol de botão.
As instituições parecem multiplicar-se, sob as mais variadas formas, como se as sociedades fossem organismos tentando mecanismos alternativos de reprodução.
Há sobreposição ou confronto entre restos de sistemas de segurança (como a Nato), ONGs (organizações não-governamentais), blocos comerciais, uniões aduaneiras, redes informais, organismos multilaterais velhos e novos (do FMI à nova Organização Mundial do Comércio, OMC).
Mesmo o que parece igual é bastante diferente: entre a União Européia, o Nafta, o Mercosul e a Apec ou Asean há mais diferenças do que supõe a nossa vã filosofia.
Aliás, mesmo o que parece pronto pode estar ainda em gestação. É o caso do Mercosul. O avanço já conseguido é notável, mas é também notável a falta de infra-estrutura básica para servir esse mercado único prospectivo.
Os custos e entraves são de tal ordem que um frete entre Argentina e Brasil equivale a percorrer uma distância de 8.000 km, quando a distância real é de 2.400.
As assimetrias entre os dois maiores parceiros do Mercosul são às vezes gritantes. Já se instalaram na Argentina mais de 300 empresas brasileiras. Nos jornais argentinos, as manchetes dão conta de empresas que são vendidas. Poucas se interessam ou se aventuram em território brasileiro.
Fica portanto evidente que, entre o Mercosul que se inicia daqui a duas semanas e o ideal de mercados integrados e eficientes, há um longo caminho.
Há algumas semanas, estive em Buenos Aires conversando com um dos economistas que mais batalharam pela criação do Mercosul. Ele estava tomado por um desânimo estrutural, convencido de que para Menem as prioridades geopolíticas são outras.
Dificuldades assim serão encontradas em todos os projetos de integração regional hoje em curso. Mesmo com relação ao Nafta, que ainda engatinha, há dúvidas sobre rumos e resultados.
Ainda é cientificamente impossível saber se a evolução do comércio entre México e EUA é fruto do acordo de comércio ou mero resultado de uma situação macroeconômica favorável, já que os EUA não param de crescer.
Mas as energias que se gastam, em todos os quadrantes, em todas as direções, certamente não são inúteis. Daqui a uma ou duas décadas será possível olhar para trás e dizer: no final do século 20 a humanidade ainda sonhava.

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