São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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Industrialização é coisa nossa

LUÍS NASSIF

A politização da discussão econômica é um atraso. Temas técnicos transformam-se em fetiches, compromissos com resultados são substituídos por interesses menores e a análise da realidade cede lugar a fantasias a serviço de jogos de poder. É o que ocorre quando se coloca a crítica à política cambial como postura antinacional.
Essa política dos oito ou oitenta, essas simplificações maniqueístas da realidade –como afirmar que a nomeação de José Serra para o Planejamento implicará a volta dos créditos subsidiados–, são típicas de amadores e/ou de oportunistas.
A economia já ingressou em nova fase, onde pontificam alguns princípios fundamentais e sem retorno. São eles:
1) Não se admitem mais protecionismos a empresas ou setores, créditos subsidiados ou formas de proteção setorial.
2) A abertura é irreversível e deve ser encarada como instrumento de aumento da competição interna e de aprimoramento da produção nacional.
3) Para a consolidação da abertura é fundamental um ambiente econômico competitivo.
O objetivo final desse jogo é fortalecer o modelo industrial brasileiro –não destruí-lo.
Em menos de quatro décadas o país se transformou de economia agrária em potência industrial porque não abandonou a bandeira da industrialização.
Nos anos 70 e 80 ocorreram distorções de monta nesse modelo, com centralismo industrial e superprotecionismo movido por razões políticas. Esse modelo morreu porque não servia mais para a estratégia nacional de industrialização. Criava empresas grandes e ineficientes mamando nas tetas do Estado, impedia o desenvolvimento de centros industriais regionais e conspirava contra a eficiência geral da economia.
Quando ocorreu o processo da abertura, muitos economistas de peso –inclusive Serra– consideraram que iria provocar desindustrialização.
Conduzida por pessoas que conheciam o universo das empresas, resultou no florescimento de uma nova economia.
O quadro atual é outro. A queda no valor do dólar, somada à abertura indiscriminada no mercado, cria um desequilíbrio tão acentuado que não haverá programas de produtividade que consigam compensar essa defasagem. Em vez de engordar, a abertura mata.
Aí a choradeira dos empresários com a abertura passa a ter fundo de verdade. Mas muitos analistas, sem conhecimento desse universo, introduzem princípios de Pavlov na economia. Se em 90 os empresários choraram sem razão, logo toda choradeira é sem motivo. E um despreparado como Ciro Gomes utiliza a retórica da desindustrialização como bandeira.
Como não se pode retornar o dólar à paridade inicial –pelos seus efeitos inflacionários–, a única saída será acelerar o conjunto de reformas que, tornando o ambiente econômico mais eficiente, compense o encarecimento da economia provocado pela política cambial. Esse será o papel de Serra.
Nem ele, nem ninguém mais terá poder para reverter a abertura ou tentar reconcentrar o poder industrial em São Paulo.
Mas ninguém conseguirá reverter a bandeira da industrialização. A ambição desenvolvimentista sempre foi e continuará sendo a grande aspiração nacional.

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