São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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Asiáticos desafiam diplomacia econômica

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há alguns meses, em conversa reservada com um especialista americano em Japão em visita ao Brasil, perguntei qual o maior problema da diplomacia dos EUA frente às economias asiáticas.
Para minha surpresa, ele apontou simplesmente a falta de quadros habilitados a compreendê-las.
É difícil acreditar. A massa crítica nos EUA, acadêmica e empresarial, é enorme. Basta reparar na quantidade de think tanks voltados para temas asiáticos, nas inúmeras reportagens na imprensa, na overdose de informação sobre as economias asiáticas.
Houve muita retórica e negociação para reverter o déficit comercial dos Estados Unidos com o Japão. Mas esse déficit com o Japão continua significativo.
Surge agora uma nova preocupação: o déficit com a China passou de US$ 10 bilhões em 1990 para quase US$ 30 bilhões (projetados) em 1994. A Business Week de 12 de dezembro fala em maremoto de produtos chineses.
Denuncia-se a produção usando trabalho escravo, por exemplo, ou restrições não-tarifárias (barreiras burocráticas, dificuldades de distribuição, etc). Mas parece difícil atribuir um déficit comercial de US$ 30 bilhões (o equivalente ao total de importações anuais do Brasil) apenas a fatores como trabalho escravo ou burocracia.
É interessante observar a estratégia do próprio Japão para lidar com o desafio de conquistar mercados externos. Claro que ajudou muito o crescimento mundial, a taxa de câmbio estável e o apoio externo na reconstrução do pós-guerra. Mas o governo japonês preparou-se para captar informação sobre os vários mercados externos.
Criou-se por exemplo a Jetro (Japan External Trade Organization), com escritórios espalhados ao redor do mundo. Cada representação da Jetro mandava informação estratégica para o Japão.
As necessidades dos mercados, os nichos inexplorados, os obstáculos de ordem burocrática ou jurídica, as idiossincrasias culturais.
Quase como um espelho desse esforço de inteligência comercial global, o lendário Miti (Ministério da Indústria e Comércio Internacional) abrigou um outro think tank, o IDE (Institute of Developing Economies), em Tóquio, com dezenas de pesquisadores, divididos por país, em equipes interdisciplinares, acompanhando de perto as realidades dos mercados emergentes (décadas antes da moda dos emerging markets).
São portanto agências permanentes, com projetos de longo prazo, acumulando informação, contatos pessoais e institucionais, empresariais e acadêmicos, capazes a qualquer momento de subsidiar a política externa japonesa e apoiar o esforço de conquista de mercados externos.
Há no mundo ainda muita instabilidade cambial, desequilíbrios tecnológicos, crises fiscais e outras anomalias macroeconômicas e institucionais.
O exemplo japonês, entretanto, pode ser interessante para ilustrar como uma rede de captação e difusão de informações comerciais estratégicas pode abrir frentes inovadoras de diplomacia econômica.
Talvez seja nesse sentido de conhecimento que o especialista americano em Japão pensava quando reclamou da atitude meio chorosa, meio rancorosa de alguns de seus conterrâneos.

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