São Paulo, quarta-feira, de dezembro de
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Fábula do tucano esperto

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA – Houve um tempo em que o leão rugia e a floresta se calava. Vivia-se então sob o império da mandíbula.
Hoje, restabelecida a democracia na selva, um bico de aparência inocente pode valer mais do que uma juba assustadora. Vive-se sob o domínio da sedução.
Daí o tucano, garboso, multicor, ter despontado como alternativa de poder. Além de belo, é bom de bico.
Ciente de suas fragilidades, à cata de apoios, atraiu cobras e lagartos para a campanha. Deu de ombros para a crítica.
Vitorioso, não se deixaria contaminar. Seria guiado por idéias. Valendo-se do grasnido sedutor, faria e desfaria. Se os aliados gostassem, muito bem. Do contrário, amém.
Chega-se ao momento da partilha do governo. À sua volta, uma fauna de Noé. Hora de esgrimir o bico, de esbanjar a prometida esperteza.
Os pefelistas exigiram a pasta dos Transportes. Inflexível, o novo rei da selva disse não. E, hábil, ofereceu-lhes o Ministério das Minas e Energia.
Entregou aos aliados estatais do porte da Petrobrás e da Cia Vale do Rio Doce, mas manteve a prometida independência. Tudo sem desgrenhar um único fio de sua plumagem. O máximo.
O PMDB, que rastejou para o seu lado apenas depois da vitória, queria a Agricultura. Qual nada. Deu uma rasteira no partido.
É verdade que teve de pôr um suposto especialista em agricultura a cuidar dos Transportes. Mas não abriu mão do poder decisório.
O presidente do PTB exigiu a Agricultura. Ardiloso, o tucano disse que dirigentes partidários não teriam direito a cargo algum. O candidato a ministro foi confirmado no posto, mas teve de deixar a presidência de seu partido. Manobra de mestre.
Como não há fábula sem moral da história, lá vai: o leão devorava os súditos para governá-los. O tucano é governado pelos súditos para sonhar que os devora.
Submoral da história: mais valem dez tucanos voando do que um na mão do PFL, do PTB e do PMDB.

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