São Paulo, quinta-feira, 22 de dezembro de 1994
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Pressões tiram Bresser da chancelaria

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Luiz Carlos Bresser Pereira perdeu o posto de chanceler por volta de 23h de terça-feira, quando recebeu um telefonema de Fernando Henrique Cardoso.
Bresser estava em São Paulo. Recebeu a ligação em casa. Falando de Brasília, o presidente eleito lhe disse que estava recebendo muitas pressões contra sua indicação para o Itamaraty.
Fernando Henrique omitiu os nomes dos opositores de seu aliado. Apenas disse a Bresser que não tinha como desconsiderar as pressões. Teria de recuar na escolha.
Consultou-o sobre a possibilidade de ocupar o posto de secretário de Administração do novo governo. Embora desejasse muito o Itamaraty, Bresser assentiu.
Desculpa pública
Ontem, ao anunciar formalmente os seus ministros, Fernando Henrique como que se justificou publicamente com Bresser.
"Eu achei melhor pedir à pessoa que estava mais próxima de ocupar esta posição (de chanceler), o economista Luiz Carlos Bresser Pereira, que viesse me ajudar em outra função".
Diante de uma platéia de jornalistas, o presidente eleito se estendeu nas referências a Bresser: "Teria todas as condições de exercer as funções de ministro das Relações Exteriores", afirmou, após resumir a biografia de Bresser. "Mas há momentos em que um presidente tem de decidir".
Fernando Henrique e Bresser haviam conversado pessoalmente na véspera do telefonema do "desconvite". Os dois se encontraram na manhã de segunda-feira, em São Paulo.
À tarde, a assessoria de Fernando Henrique informou que, convidado, Bresser seria o novo ministro das Relações Exteriores.
Quase convite
Animado, Bresser chegou a disparar telefonemas para Sebastião do Rego Barros, embaixador do Brasil em Moscou. Tinha a intenção de convidá-lo para ocupar a secretaria-geral do Itamaraty.
Um desencontro impediu que Bresser encontrasse Rego Barros. O embaixador estava em trânsito para Brasília, numa viagem com escala em Nova York.
A informação sobre a escolha de Bresser chegou a Washington na noite da mesma terça-feira. Paulo Tarso Flecha de Lima, embaixador do Brasil nos EUA, soube da novidade pelo telefone. Foi informado por um jornalista.
Reações
Teve uma reação que misturou espanto e decepção. Na manhã de quarta-feira, a notícia saiu nos jornais. O espanto de Flecha de Lima espalhou-se por todo o Itamaraty.
Os diplomatas esperavam que a escolha recaísse sobre um profissional de carreira. Festejava-se a boa cotação de Luiz Felipe Lampreia, embaixador brasileiro junto à ONU na Suíça.
Reservadamente, em diálogos com amigos, Bresser Pereira mostrava-se convencido ontem de que sofreu oposição aberta de Flecha de Lima e do ex-governador baiano Antônio Carlos Magalhães, cacique do PFL.
Flecha de Lima é, individualmente, o personagem mais influente do Itamaraty. Possui ramificações políticas. É amigo íntimo de ACM.
Questionado sobre o tema, Bresser disse: "Estou surpreso. Sempre tive com ambos um bom relacionamento. Sempre afirmei que o Paulo Tarso é um grande embaixador".
Contactado por vários interlocutores, ACM dizia, da Bahia, estar desinformado sobre a mudança de planos de Fernando Henrique.
Flecha de Lima negava ter feito "carga contra Bresser". Dizia que o conhece há cerca de 20 anos. "Não tenho nada contra ele. E a escolha de ministros é da competência exclusiva do presidente eleito".
A Folha apurou que Fernando Henrique ficou impressionado com a má recepção do nome de Bresser no Itamaraty. Como ex-chanceler, não lhe agradava a idéia de levar insatisfação à Casa.
A forte reação abalou sua convicção da véspera. Disse aos auxiliares que estava decidido a premiar Bresser, tesoureiro oficial de sua campanha com um posto na esfera federal.
Bresser desejava muito o Itamaraty. Havia conversado com o presidente também sobre o setor de administração pública, mas de forma periférica.
Em diálogo anterior com o governador eleito de São Paulo, Mário Covas, dissera que só aceitaria um posto estadual se não fosse convidado para um cargo em Brasília.
Se ficasse em São Paulo, ocuparia a Secretaria de Relações Internacionais. Em Brasília, queria o Itamaraty.
À noite, o presidente telefonou a Bresser. E de manhã, ao anunciar o ministério, declamou o nome de Luiz Felipe Lampreia, a escolha do coração da diplomacia. Bresser foi chanceler por pouco mais de 24h.

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