São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 1994![]() |
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Zélia e Amado no jardim
OTÁVIO DIAS
Em 1945, a união provocou escândalo. Os dois eram desquitados, só puderam legalizar o casamento muitos anos depois, com a chegada do divórcio. Isso, no entanto, não tem importância. No próximo 7 de julho, vai ter festa. O casal comemora bodas-de-ouro: 50 anos é tempo demais? Parece que não. "Tive a felicidade que ela gostasse de mim", confidencia Jorge no curto diálogo dos dois a seguir. Jorge - Para mim, é fácil ser fiel. Sou casado com uma mulher muito bela, muito reservada, muito pudica... Zélia - Que pudica coisa nenhuma. Agora, ele deu pra inventar essa. Quando ler meu romance, vai cair duro. Eu sou realista. Jorge - Tive a felicidade de que ela gostasse de mim, quisesse viver comigo. Temos um relacionamento de amor, amizade e carinho, de muito respeito mútuo. Eu brinco muito, faço pilhéria, piadas de mau-gosto. Aí ela se zanga, ameaça me bater, digo 'não me bata'. A fidelidade não me custa esforço, mas não dá para generalizar uma coisa dessas. Zélia - Para mim, quem tem amor não pode ser infiel ao ser amado. O sexo depende de amor. Jorge - Tenho um casal de amigos, ela corneou o marido a vida toda, dizem que ele tinha chifre até no calcanhar. Ele também deve aprontado muito. Envelheceram e são um casal feliz. A vida não é feita de generalizações, mas de particularidades. Sou hoje um homem de poucas afirmações. Posso afirmar que Zélia é ótima esposa. De vez em quando, me pisa nos calos, como eu piso nos dela. Por exemplo: sou filho de um homem que era pura bondade, mas que falava alto, como se estivesse brigando. Herdei isso. De vez em quando, Zélia diz: 'Não me grite'. Zélia - Há dois pesos e duas medidas. Ele pode gritar quanto quer, mas se eu falar um pouquinho mais alto, ele enlouquece: 'Eu grito porque meu pai gritava', diz. Sabe o que respondo? 'Nesse caso, meu pai gritava ainda mais que o teu, porque o meu era italiano, gesticulava, blasfemava'. Jorge - É uma mulher arretada. Se eu fosse ciumento, morreria de ciúmes de Carybé. Os dois são italianos, mafiosos, mantêm longas conversas em italiano. Zélia - Com Carybé, só converso em italiano. Jorge bóia e fica indignado. Jorge - É uma descaração. Você me pede para enumerar algumas perguntas que Zélia nunca respondeu pra mim. Há apenas uma. Tentei fazê-la por intermédio de Caymmi, sempre fui tímido... Zélia - Olha a cara dele, precisava fotografar essa cara. Jorge - Eu estava querendo namorar Zélia. Um dia, numa festa, pedi a Caymmi que cantasse uma música dele que dizia 'Acontece que eu sou baiano, acontece que ela não é. Por que que eu vim de longe pra gostar dessa mulher?' A pergunta que eu quis fazer, ela não respondeu até hoje, me deixou no suspense: 'Você gosta de mim?' Zélia - Oh, Jorge, você está farto de saber... Também tenho uma pergunta a fazer: 'Por que você se recusa a dançar comigo?' Jorge - Sou um dos homens mais incapazes do mundo. Não sei dançar, não sei nadar, não sei dirigir automóvel. Zélia - Há dois anos, em 14 de julho, dia da Tomada da Bastilha, estávamos em Paris. Todo mundo cantava e dançava. De repente, Jorge chega perto de mim e, muito solene, diz: 'A senhora quer me dar o prazer de dançar comigo?' Levei um susto tão grande que respondi: 'Você... quer dançar comigo?' Ele retrucou: 'Se não quer, não tem importância'. Me apressei: 'Claro que quero'. Me agarrei a ele, mas não foi nem meio minuto, acabou. Foi a única vez. Texto Anterior: Anna, a amiga fundamental Próximo Texto: Sonia Braga, filha e "amante" Índice |
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