São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 1994
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Anna, a amiga fundamental

OTÁVIO DIAS
DO ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR

Convidado a falar de suas mulheres preferidas, Jorge Amado só quer saber de Zélia Gattai. O repórter insiste, ele cede. Lembra-se da melhor amiga, a escritora alemã Anna Seghers (1900-1983). No final, o escritor abre o jogo: é um confidente preferencial do sexo feminino.

"Não sei o que seria se não fosse Zélia. São 50 anos juntos. Fora disso, há uma distância muito grande. Mas tenho muitas amigas. O que as mulheres me confidenciam é algo espantoso. Elas me contam coisas. Isso é muito útil para um escritor.
Minha amiga fundamental foi Anna Seghers, autora de 'Sétima Cruz', livro antinazista. Escreveu todo um livro de contos ali, no jardim, sob aquele sapotizeiro. Tivemos as mesmas experiências, mas ela manteve-se fiel ao PC até o fim de seus dias. Um dia, falou: 'A cada qual seu erro. O de alguns é a dúvida, o meu é a certeza. Acredito e continuarei a acreditar mesmo contra a evidência'.
A última vez que a vi foi na Alemanha Oriental, estava muito velhinha. Fomos visitá-la, ela me disse: 'Jorge, escrevi uma carta há poucos dias, ia botar no correio quando soube que você vinha. Faço questão que a leia'.
Levei a carta. Contava em tinta azul coisas do dia-a-dia. Mas, na primeira página, destacado em verde, estava escrito 'Quelle solitude!'. Acho que fui a única pessoa a quem Anna confessou a solidão em que vivia."

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