São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 1994
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A história recomeça

Houve um momento da história recente, na esteira da falência do comunismo e da queda do Muro de Berlim, em que parecia haver um forte consenso no sentido de que o receituário neoliberal era a alternativa restante para a humanidade.
Na América Latina, governo após governo recorreu a fórmulas do gênero para reorganizar a economia.
Privatização e abertura comercial tornaram-se quase que sinônimos inescapáveis de modernidade, num jogo pendular em relação ao modelo anterior, calcado num relevante papel do Estado como empresário e numa proteção, não raro abusiva, das empresas ditas nacionais.
O terremoto que abalou os alicerces da economia mexicana esta semana parece demonstrar que, com todos os seus inegáveis méritos, a receita neoliberal está longe de ser a panacéia universal.
É verdade que já havia elementos anteriores para mostrar que a fé cega no mercado podia ser tão equivocada quanto a fé cega no Estado.
O Reino Unido de Margaret Thatcher, emblema-mor do neoliberalismo, produziu estatísticas reveladoras sobre o aumento da pobreza e da desigualdade.
Mas a questão social ficou de lado nas discussões mais recentes, como se a economia fosse uma ciência destinada a produzir estatísticas mais brilhantes e não seres humanos mais felizes.
O próprio México, aliás, poderia, antes mesmo do tremor cambial desta semana, servir de exemplo dos custos de políticas ortodoxas quando não acompanhadas de compensações sociais adequadas.
Mas, agora, o ponto de interrogação está colocado não apenas sobre a questão social, mas sobre o próprio cerne das políticas econômicas latino-americanas. O que se verifica é que, além de acumular uma dívida social, o modelo acaba gerando déficits comerciais e/ou de balanço de pagamentos que podem tornar insustentável toda a arquitetura. A do México, pelo menos, não resistiu. Há muitos especialistas que suspeitam de que a Argentina pode vir a ser a próxima vítima.
Não se trata, é óbvio, de condenar a abertura e a privatização, eixos das políticas neoliberais. Até porque deixaram de ser uma questão ideológica e se transformaram em uma necessidade.
Trata-se, isto sim, é de alertar para o fato de que o dogmatismo tende a ser perigoso. Assim como o dogma do Estado que tudo pode matou a União Soviética, o dogma do mercado onipotente feriu o México. O que só demonstra que o homem ainda não foi capaz de inventar a fórmula que produza o Paraíso na Terra.

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