São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 1994
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No mínimo, incompetência

As inaugurações, esta semana, de uma estrada pelo governo paulista e de um pronto-socorro pela prefeitura paulistana podem parecer dois acontecimentos desconexos. Mas ambas oferecem ilustrações típicas e desanimadoras da crônica falta de planejamento que acomete a administração pública no país.
A rodovia Carvalho Pinto, por exemplo, vai funcionar por enquanto apenas num sentido. A segunda pista ainda não está pronta.
É até justificável colocar em uso uma obra incompleta, se isso beneficiar a população. O problema é que a conclusão da rodovia –com ambas as pistas– estava prevista para outubro passado. Mais, o custo total era orçado em US$ 400 milhões, mas os gastos até agora já atingem US$ 700 milhões.
Não se trata de pequenas discrepâncias compreensíveis. São diferenças assombrosas que, no mínimo, revelam completa incompetência do órgão planejador, além de levantarem inúmeras suspeitas. Os prejuízos para os contribuintes, de todo modo, são consideráveis.
Já na rede municipal de saúde, o problema é outro, mas a causa é a mesma falta de planejamento. A prefeitura fez um concurso para contratação de 700 médicos, mas ofereceu salários tão baixos que só 40 dos aprovados aceitaram trabalhar. Assim, o pronto-socorro do Hospital Tide Setúbal foi inaugurado em condições precárias de funcionamento por falta de pessoal.
Nesse contexto, é triste notar que, pelo menos contra obras atrasadas e de orçamento estourado, há um remédio eficaz: o seguro-garantia (ou "performance bond"), que passa o risco do Estado para instituições financeiras. Lamentavelmente, os governantes relutam em adotar esse sistema para todas as obras públicas.
Pior, porém, é que esses dois exemplos repetem-se, em formas variadas, quase cotidianamente em todo o país, revelando um endêmico problema gerencial do Estado que só será atenuado com medidas ousadas como o seguro-garantia e uma radical reforma no setor público. Até lá, a inépcia –ou algo pior– dos administradores, sistematicamente impune, vai continuar a cobrar seu custo elevadíssimo do bolso de cada contribuinte.

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