São Paulo, quarta-feira, 28 de dezembro de 1994
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Superfiscais na idade da pedra

A idéia do futuro Secretário da Receita Federal, Everaldo Maciel, de unificar as atribuições dos fiscais da União, Estados e municípios é, no mínimo, questionável.
A legislação tributária das três esferas de governo é extrema e lamentavelmente complexa. Só uma verdadeira revolução tributária abriria caminho para coibir a sonegação. Mesmo que se faça rapidamente tal reforma profunda, nada permite supor que o fiscal da Prefeitura de uma dada cidade, por exemplo, tenha conhecimento adequado para aplicar de modo eficiente a legislação tributária do Estado e da União.
Na impossibilidade de conhecer satisfatoriamente as leis, regulamentações e procedimentos pelos quais devem zelar, os fiscais honestos terão grandes dificuldades para coibir de fato a sonegação.
Em contrapartida, os fiscais desonestos veriam aumentado seu poder de extorsão. Se, pela complexidade da tarefa, o benefício de uma unificação das fiscalizações já é duvidoso, a ampliação do poder dos corruptos torna a iniciativa francamente contraproducente. Os bons fiscais poderão trazer pequenos ganhos e os maus fiscais poderão causar imensos prejuízos.
Em vez de unificar a cobrança na ponta da fiscalização, seria muito mais eficaz promover maior troca de informações tributárias entre a União, os Estados e os municípios. Para que as diferentes esferas de governo possam estar interligadas é necessário, porém, que os sistemas de arrecadação e fiscalização sejam informatizados.
E, nesse campo, o atraso do Brasil é tão espantoso que, até hoje as declarações do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas do ano de 1992 ainda não foram processadas.
A informatização dos sistemas de fiscalização, além da indispensável reforma tributária, é o caminho para coibir a sonegação. O caso do Ceará é eloquente: graças a uma rede de computadores, é possível até do gabinete do governador acompanhar o movimento de cada setor da economia e detectar de pronto qualquer redução no pagamento de impostos. O próprio sistema emite, então, convite ao contribuinte para que dê explicações.
A União, no entanto, tem o seu sistema de processamento de dados centralizado no Serpro, o que retira da Receita um instrumento essencial de informação e, portanto, de vigilância.
Aumentar o poder dos fiscais e manter uma estrutura arcaica e ineficiente seria um convite à corrupção. O país poderia ter superfiscais, mas o sistema de fiscalização continuaria na idade da pedra.

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