São Paulo, quinta-feira, 3 de fevereiro de 1994
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'Valor básico é o crescimento econômico'

PEPE ESCOBAR

Para Jadiel Ferreira de Oliveira, Brasil pode exportar mais produtos manufaturados para Cingapura
Continuação da pág. 6-8.

Folha - Mas a República bania os poetas. Algo que não se associa a Cingapura é criatividade cultural. A impressão é a de uma população cujo valor básico é o crescimento.
Oliveira - É verdade. Mas Cingapura começou do nada. Primeiro teve que atender necessidades materiais básicas. A primeira coisa a levar em conta no processo da Asia moderna é a necessidade de sobrevivência. São povos marcados historicamente por fomes endêmicas e grandes privações.
Folha - Diz o "Economist" que o mais importante fenômeno contemporâneo é a modernização da Asia. Como o Brasil pode se inserir nesse processo?
Oliveira - Acho mais. Há um efeito desestabilizador nessa modernização da Asia. Os protagonistas clássicos tradicionais estão sendo deslocados. E estão protestando. Mas não há muito como reagir porque eles– a Europa, os Estados Unidos– não têm como competir em manufaturas como a Asia. Estamos falando do acesso da Asia à revolução tecnológica, do acesso de alguns países asiáticos à condição de produtores de manufaturas de boa qualidade, a custos inferiores às produzidas nos países industrializados.
Folha - Praticamente, o que o Brasil pode importar e exportar para esses mercados?
Oliveira - Tudo. Eles são muito exigentes em qualidade porque competem com o mundo. Para que o Brasil venda para a Asia, os padrões devem ser internacionais. Como são mercados em expansão, têm um poder de compra muito grande. Cingapura nos compra hoje só US$ 300 milhões por ano. As possibilidades de venda para o Brasil dependem de nós.
Folha - O que o Brasil está deixando de exportar?
Oliveira - Poderia exportar mais manufaturas. Mas é preciso conhecer como Cingapura funciona. Eles compram para a Asia inteira. Um bilhão de consumidores. Cingapura é um canal de distribuição. Conhece os canais de exportação para a China. Porque tem conexões, fala a língua, sabe como funciona a mentalidade chinesa e é parte do "network" dos "overseas chinese".
Folha - Sem um modelo de política industrial –assim como Taiwan tem o seu–, como se pode criar credibilidade internacional e penetrar no comércio de blocos econômicos?
Oliveira - É necessária uma política industrial. Ela deve ser fruto de um amplo debate entre todos os segmentos da sociedade civil –universidade, empresariado, associações de classe, sindicatos, governo–, para que haja um consenso sobre qual modelo econômico o Brasil vai adotar. Não pode ficar oscilando entre um extremo intervencionismo estatal ou um neoliberalismo exagerado.
Folha - Em 94 estaremos comprometidos com o exame dos problemas internos, e nos atrasaremos mais um pouco.
Oliveira - Eu acho que o bom senso prevalecerá. As tendências da economia mundial são tão óbvias para todo mundo que nenhum partido político escapará de certas conclusões. A questão hoje é saber em que grau, com quem e de que maneira o Brasil tem que se inserir na economia mundial
Folha - Como o sr. venderia o Brasil para Lee Kuan Yew, o homem que praticamente moldou Cingapura à sua imagem?
Oliveira - Ele é muito inteligente. Educado em Cambridge, um dos líderes mais respeitados da Asia, consultado por todos. Já viu de tudo no mundo. Ele já entendeu até a Africa do Sul. Haja CPI para ser mais complicada que a Africa do Sul... Ele vem, olha, recomenda investimentos. É uma espécie de embaixador itinerante. Ele reconheceria nosso potencial.
Folha - O século 21 será mesmo o "Século do Pacífico"?
Oliveira - Com certeza.

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