São Paulo, sexta-feira, 4 de fevereiro de 1994
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Insistência irritante

A abulia labôrfoba que vem caracterizando o Parlamento já transpassou os limites da irresponsabilidade. Ontem, a confusão era geral. O ministro ameaçava renunciar e verberava contra a paralisia do Congresso Nacional. Chegou mesmo a sugerir a criação de uma assembléia revisora exclusiva. As Bolsas caíam. Foi preciso esse turbilhão para que o Parlamento reunisse forças para obter quórum –fato raro às quintas-feiras– e aprovar uma inversão de pauta, que coloca a criação do Fundo Social de Emergência, um dos pontos centrais do Plano FHC, numa posição um pouco mais confortável. Agora, se tudo correr no ritmo do Congresso, é possível que, na próxima semana, o FSE seja finalmente votado.
Deputados e senadores parecem continuar a ignorar o momento extremamente grave que o país atravessa. Insistem em ignorar que a inflação é um fenômeno perverso que pune severamente os que nada ou pouco têm –a maioria da população do país–, fere levemente os que têm algo e dá ainda mais aos que têm muito. Continuam a ignorar que há uma proposta do governo para acabar com o mal inflacionário. Persistem ignorando que recebem dinheiro público para comparecer às sessões e votar segundo suas convicções: se consideram o plano bom, devem aprová-lo; se o consideram ruim, devem rejeitá-lo e propor uma alternativa.
Os "nobres deputados e senadores" continuam a ignorar que estão realizando uma revisão da Carta, o que, por tratar com a própria estrutura do país, ainda coloca um quinhão de responsabilidade imensamente maior sobre seus ombros. Insistem em ignorar, no entanto, que são eles os responsáveis pelo processo revisional, o que exige quórum, votações e muita atenção.
A paralisia parlamentar já está há tempo demais imperando no país. Contudo, foram a tramitação do Plano FHC e os trabalhos da revisão constitucional que a tornaram mais gritante. Os legisladores não podem continuar a ignorar que esse é mais um fator de desgaste para a já extremamente carcomida imagem do Congresso, já atingindo até o próprio conceito de democracia. De resto, não se pede aos congressistas mais do que se exige da imensa maioria da população: que trabalhem de segunda a sexta.

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