São Paulo, segunda-feira, 7 de fevereiro de 1994 |
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Congresso oportunista
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES SÃO PAULO – Quase comovente o esforço do ex-ministro Mailson da Nóbrega na defesa do Congresso Nacional, em artigo publicado na seção "Tendências/Debates". Pena que, no mesmo dia, a atual legislatura tenha-se mostrado, mais uma vez, indefensável: a Câmara respondeu ao texto de Mailson aprovando o famigerado decreto-legislativo que isenta produtores rurais de correção monetária e gera, segundo cálculos do Banco do Brasil, um rombo de US$ 97 bilhões.Na última sexta-feira, neste espaço, Marcelo Coelho referia-se aos fatores que vêm se combinando para conformar a irritante atuação do Congresso. A eles acrescentaria um agravante: a presença inercial de uma cultura política desossada, paroquial e oportunista que parece empurrar a vida pública brasileira sempre –e compulsivamente– para o abismo. É impressionante o grau de irresponsabilidade de nossos parlamentares quando trata-se de defender interesses particulares em detrimento da chamada coisa pública –sejam eles de grupos econômicos, de coletivos corporativistas, de seus próprios partidos ou carreiras políticas. Os obstáculos que se vêm erguendo à aprovação das medidas pedidas pela Fazenda e a aprovação do decreto-legislativo dos produtores rurais são apenas exemplos recentes –e gritantes– dessa exasperante miopia política. Todos sabem que a má-vontade contra as propostas da Fazenda é proporcional ao interesse em impedir que o ministro venha a acumular cacife eleitoral. Ou seja: o êxito do ajuste não pode coincidir com o êxito do ministro da Fazenda. Um dos dois tem que fracassar –e se for o caso, que fracassem os dois. Pouco importa que a inflação continue descontrolada: empurra-se com a barriga até o próximo governo e recomeça-se tudo de novo. Até lá, resta aproveitar o festim –como fazem os promotores do tal decreto-legislativo. Incrivelmente o cálculo político do Congresso nesses momentos despreza frontalmente a reação da sociedade. Não passa pela cabeça de nossos congressistas que esta afronta ilimitada pode voltar-se contra eles mesmos ou –pior– fomentar um ambiente de revolta propício às aventuras autoritárias tão a gosto de nossas tradições? Texto Anterior: Selva de regras Próximo Texto: Sobre a pornopolítica Índice |
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