São Paulo, quarta-feira, 9 de fevereiro de 1994
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Uma mutreta ganha força

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – O ponto essencial do efervescente e gigantesco debate sobre o plano econômico é simples: o governo não tem dinheiro. E, daí, aumentam-se impostos e cortam-se gastos, na busca de cada centavo possível. Por isso nada mais absurdo do que um silencioso movimento de bastidores que, se vitorioso, vai promover ainda mais desperdícios.
A idéia foi lançada timidamente –acabar com o prazo de mínimo para que os candidatos saiam do governo para disputar a eleição. A máquina administrativa já é descaradamente usada nas campanhas. Basta ver, por exemplo, como os bancos estaduais abrem rombos. Imaginem, então, se acabarem com o prazo de desincompatibilização.
Os poderosos governadores estão convencendo parlamentares. Só não querem aparecer. Não querem ser acusados de legislar em causa própria. A articulação está a tal ponto avançada que lideranças do Congresso estão cada vez mais convencidas de que vai passar –e poucos têm dúvida sobre as consequências nos gastos públicos.
Da forma como está sendo proposta, é uma mutreta –uma mutreta do tipo da anistia aos agricultores, na qual sai perdendo o cidadão, favorecendo as camadas mais privilegiadas. Em tese, até que se poderia acabar com a desincompatibilização, mas com garantias de punição imediata do abuso de poder. Não é o caso.
Parece que o país enloqueceu. Simplesmente não há lógica. Aumentam-se os impostos dos indivíduos, mas preservam-se as empresas. Cortam-se gastos, os hospitais estão em coma, em alguns deles até a luz está sendo racionada. Mas um expressivo número de parlamentares resolveu, numa tacada, abrir um rombo de US$ 97 bilhões apenas no Banco do Brasil –e muitos dos parlamentares são beneficiários diretos da pouca-vergonha.
Um fato é inquestionável: esse nível de descalabro apenas acontece porque uma expressiva massa das população é ignorante, desinformada e não sabe o que está acontecendo.

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